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sábado, 26 de junho de 2021

Séc. XIX: Memórias dum Padre

Desde que nascemos, fomos ouvindo da voz de quem ouviu de quem, que a luta pela posse de S. Pedro com os das paróquia de Penaverde, teve registos sangrentos. E eis que hoje, por gentileza do meu amigo João Nunes, é possível saber e tornar público uns documentos, num português que todos compreenderão, acerca das quezílias em S. Pedro, votos da freguesia, etc..:

Do Livro de Óbitos AII-A 1.2 Cx. 8 (fls. 42v)

"No dia seis de maio de 1875 5.ª feira de Ascenção ouve um grande barulho em S. Pedro entre os de Dornelas e os de Penaverde donde resultou muitos ferimentos e eram tantos os tiros as pedradas e os gritos que parecia que acabava o mundo; ficaram culpados 12 rapazes de Dornelas e tres de Penaverde de que foram absolvidos em audiência geral. Desta freguesia ninguém ficou culpado...do barulho não ouve mortes mas um rapaz de Dornelas esta há mais de um mês sem falar. 
Padre Francisco de Almeida Coelho, de Dornelas natural" (fls. 42 verso).
Documento disponível online:

De Forninhos ninguém ficou culpado, mas na folha 42, o Pároco de Dornelas natural tinha registado que veio para a freguesia de Forninhos em 1858 para "encontrar um povo rude e estupido (e mau)...."

Fl. 42 do Livro de Óbitos AII-A 1.2 Cx. 8

"...tem os parochos desta freguesia de avisar os freguezes para os dias em que ouverem de ser cumpridos porque nos devemos respeitar as crenças dos nossos antepassados apesar de que esta época ser a do indesentismou a do vandalismo por isso procurando em muito os senhores párocos que me sucederam que cumpram e façam cumprir não so por respeito a religião de quem somos ministros, mas também para exaltarmos a fe no povo de que somos pastores; tambem ha que dizer que vim para esta freguesia em 1858 para encontrar um povo rude e estupido (e mau) hoje com ajuda de Deus tem milhorado muito, e espero com a ajuda de Deus por aqui me conserve por mais alguns anos, encontrei muita rapaziada de perto de 20 anos sem saber quem era Deus e poucas pessoas avia que soubessem o que era preciso ao Christao para se salvar e ora felizmente já se sabe alguma cousa.
Forninhos 8 de Junho de 1872."

Este padre ainda nos deixou uns apontamentos muito interessantes a respeito dos votos da freguesia (Fl. 43):

Fl. 43 do Livro de Óbitos AII-A 1.2 Cx. 8

"Tinha esta freguesia de tempos imemoriais um voto a Senhora da Lapa todos os anos em dia de S. Barnabé por motivos que expos o reitor de Penaverde que era quem então figurava nesse voto como capelão da câmara do concelho então de Penaverde e como arcipreste requereu e obteve a transferência dela para a capela da S.ª do S. João da sua freguesia e assim um outro que se fazia a S. Clemente na capela do Furtado freguesia de Algodres, ora esta freguesia não gostou da transferência e por isso pouca gente lá ia e passado algum tempo já ninguém o cumpria razão porque eu requeri e obtive de S. Exma transferência do de S. Clemente e do da Senhora da Lapa para a capela da Senhora dos Verdes desta freguesia onde se deveria cumprir o de S. Clemente na 2ª feira ou 3ª do Espirito Santo como era costume e da Senhora da Lapa dia de S. Barnabé ou em outro que melhor parecer ao pároco segundo as cirunstâncias porque assim lhe requeri.

Cópia do requerimento

Exmo Senhor
Diz o pároco da freguesia de Forninhos que havendo na sua freguesia alguns votos como são um a Senhora da Lapa que dista vinte e quatro quilometros da sua freguesia e já em tempo foi transferido para uma capela da freguesia de Penaverde assim como outro a S. Clemente onde o povo os não quer ir cumprirnem ele suplicante insta porque os não cumprira sem a reverencia que lhe é devida muitas vezes fazem desordens pelo caminho e por isso pede a graça de comutar para a capela da Senhora dos Verdes sita nesta freguesia onde podem ser cumpridos."

Fl. 33 do Livro de Óbitos AII-A 1.2 Cx. 8

No dia 4 de Janeiro de 1898 veio paroquiar Forninhos o Pe. José de Almeida Coelho, por ser já paroco da freguesia de Dornelas. E, voltando atrás no Livo, fls. 33, disse ter recebido do seu antecessôr os livros existentes no cartório,"entre os quaes apareceu este no estado que se vê, com cinco folhas cortadas; e com as que não de página 33 a 41 em branco e no fim de tudo uma notícia a respeito de votos a que estavam obrigados as mesmas freguezias. Para que nao julguem que ele foi mutilado em meu poder, aqui lavro esta nota, que assigno.
Parochia de Forninhos, 4 de Janeiro de 1898 oito
Pe. Jose de Almeida Coelho."
(Sublinhado nosso)

Fonte: Livro de Óbitos de Forninhos.

O que estava escrito nas cinco folhas cortadas nunca o vamos saber. Quem as cortou também dificilmente o saberemos. O que sabemos é que passados mais de 150 anos ficamos a saber aspetos importantes da realidade da nossa freguesia no século XIX.

segunda-feira, 21 de junho de 2021

O tom do Verão

No meu livro de leitura da 2.ª Classe o verão era representado por uma seara loira. Esta ilustração anunciava o tempo de muito calor e as férias grandes no campo ou na praia. 
Eram tardes de jogos e brincadeiras, mas também de trabalho, ajudando os nossos pais nas lides do campo.
Costumava ter 3 meses e as histórias destes dariam para 3 livros, pelo menos.

Ilustração Maria Keil e Luis Filipe de Abreu

No Google hoje, a ilustração mostra um ouriço-cacheiro a caminhar num cenário solar, com óculos de sol e rodeado de folhas verdes, frutas sol e conchas. 


Sinais de novos tempos!

sábado, 12 de junho de 2021

Casamentos, Sec. XVII

A obrigação da igreja manter registos de casamento, nascimento e óbito, surgiu no Concílio de Trento em 1563, mas a data de início dessa prática não foi igual para todas as paróquias, registe-se que de Forninhos, o primeiro assento de baptismo de que há conhecimento é de 1634, em Penaverde 1626, em Aguiar da Beira 1609, em Carapito 1604, nas Antas 1589.
Assim, começo hoje a publicar uns registos de casamento do séc.XVII.

É fácil ler os registos

Acima temos o registo de casamentos nos anos de 1650, 1651 e 1652 


A segunda imagem é um pormenor da primeira, na qual está ampliado o nome do casal Manuel Fernandes e Maria Antunes que casaram faz exactamente hoje 370 anos. O pároco João Baptista registou assim esse facto:
"Aos doze de Junho de mil seiscentos e cinquenta e hum annos feitas as denunciações conforme o Sagrado Concílio e Constituições deste Bispado e testemunha o povo recebi em face da Igreja Manuel Fernandes e Maria Antunes deste Lugar e por ser verdade fiz este termo e assinei  dia, mês e era ut supra."
Não são referidos padrinhos "testemunha o povo". Era segunda-feira e na aldeia, pelo menos alguns habitantes devem ter interrompido os trabalhos do campo.


Em 1645 e 1646 parece ter havido apenas um ou dois casamentos por ano:
1- João Domingues e Antónia João (15-01-1645)- Domingo
2- Diogo João e Maria João (10-09-1645) -Domingo
3- Silvestre João e Maria Dias (15-08-1646) - Quarta-Feira (Dia Santo)


Destacamos o de Silvestre João e Maria Dias, no dia 15 de Agosto de 1646, "forão padrinhos Balthazar da Fonsequa, Pedro Vaz eh mais povo, por ser dia Santo...".  
O Pe. Cura faz referência ao dia Santo, mas não à festa da aldeia, por nessa altura não haver, mas  certamente houve boda na casa da noiva.

Outros casamentos do séc. XVII: 
No ano de 1647 contamos meia dezena e assim crescia a aldeia, mas entre 1648 e 1649 o número é novamente reduzido a um casamento anual:
1- Bartolomeu Almeida e Isabel Pires (14-05-1647) -Terça-Feira
2- Francisco Lopez e Isabel Domingues (01-09-1647) - Domingo
3- António Gomes e Maria Nunes (26-10-1647) -Sábado
4- Mateus Nunes e Isabel Antunes (05-11-1647) -Terça-Feira
5 - Francisco Vaz e Maria João (30-11-1647) -Sábado
6- António Fernandes e Catarina João (19-01-1648) - Domingo
7- António Belchior e Catarina Fernandes (03-02-1649) - Quarta-Feira


Onde estão e quem são os descentes destas famílias?

sexta-feira, 4 de junho de 2021

Dona Escolástica

Chamava-se Escolástica Moreira Mendes de Faria e nasceu na freguesia do Eirado, onde viveu até casar. O matrimónio foi anterior a 1860, com José Fernandes de Figueiredo, residente na Rua da Lameira, Forninhos. Teria mais de 40 anos quando casou e veio morar para Forninhos (os mais de 40 anos são apenas uma hipótese). Mas aqui viveu certamente mais outros 40 anos, sendo considerada de Forninhos, pelo cura António Augusto Almeida Coelho, que registou o seu óbito. Dona Escolástica faleceu no dia 4 de Julho de 1902, tinha 89 anos. 
Sua única filha, Maria dos Prazeres, nascia no dia 04 de Março de 1860 e foi batizada em Forninhos no dia 28 de Março do mesmo ano.

Registo Bapt.Dona Prazeres

Dona Escolástica enviuva a 26 de Maio de 1870, o seu marido José Fernandes de Figueiredo morre com 39 anos de idade. 
Sua filha, Maria dos Prazeres casa no dia 18 de Maio de 1874 com José Maria Alvares Moreira, em Forninhos. Tinham 14 e 20 anos de idade, respectivamente. Eram segundos primos.
Foram testemunhas do casamento sua mãe, Dona Escolástica Moreira de Faria e Luís Augusto Varela, de Dornelas.
A partir do casamento a documentação já refere Dona Maria dos Prazeres Fernandes Alvares Moreira.

Casamento Dona Prazeres (filha)

Em Forninhos nasceram os seus filhos:
Olímpia nasceu em 1876 (03 de Abril)

Registo Dona Olimpia


Em 1879 (14 de Fevereiro) nasce o segundo filho:
Albano

Registo do filho Albano

Em 1887 (21 de Julho) nasce a Maria José 
Mas a felicidade da Dona Escolástica não durou muito. No dia 23 de Maio de 1888 morre a sua única filha Dona Maria dos Prazeres Fernandes Alvares Moreira. Tinha 28 anos de idade. 
Qual o percurso dos netos da Dona Escolástica?
Dona Olímpia faleceu na freguesia de Samuel, concelho de Soure, em 04-11-1957, era solteira.
Albano ???? ninguém de Forninhos foi capaz de me fornecer informação útil e no seu registo de baptismo nada consta. Mas como no registo de óbito da Dona Prazeres é referido que fez testamento e deixou duas filhas, presumo que à data era falecido.
Dona Maria José casa com Pompeu de Mendonça e Pinho, de Açores, Celorico da Beira, no dia 25 de Agosto de 1910, na freguesia de Porto da Carne, Diocese da Guarda e assina Maria José Alvares Moreira. 
Aqui são donos de uma grande fortuna.
O casal tem uma filha a que deram também o nome da avó, Maria dos Prazeres
Dona Maria José faleceu no dia 13-11-1949.

Registo Dona Maria José

Maria dos Prazeres (neta da Dona Escolástica) vem a casar com Octalicio Amaral o qual deu origem ao apelido de família "Amaral". Perdeu-se o "Fernandes de Figueiredo" e o "Alvares Moreira".
O casal Amaral teve dois filhos que também faleceram jovens:
 - Luis Manuel Alvares Amaral (Luisinho) - está sepultado no cemitério de Forninhos.
- José Maria Alvares Amaral (Zezinho)
Nos anos 80 do século passado ainda vivia em Forninhos a Senhora Dona Prazeres e os seus netos (uma filha do Luisinho e dois filhos do Zezinho) ainda a visitavam. 

Casa da Família, em Forninhos

Uma das coisas que me despertou alguma curiosidade foi a genealogia dos "Fernandes de Figueiredo".
Luis Fernandes de Figueiredo e Maria Antónia tiveram três filhos:
- O José Fernandes de Figueiredo, marido da Dona Escolástica, faleceu com 39 anos no dia 25-05-1870
Maria Antónia Figueiredo, solteira, faleceu com 52 anos dia 16-11-1870 e fez testamento fechado em nome do irmão Manuel.
Fazer testamento dos bens que se possuíam era uma prática comum, mas é interessante esta informação porque parece que as últimas vontades do testador era a cunhada, a Dona Escolástica, não ser herdeira, fora também a intenção de continuar a exercer algum poder e controlo social para além da morte.
- Manuel Fernandes Figueiredo, solteiro, faleceu em 25-02-1872 e fez testamento. Tinha 37 anos.
Acerca desta família os mais antigos documentos conhecidos (de 1696) referem um António Fernandes sepultado "dentro da Igreja de fronte da porta travessa debaixo do caixam da confaria do Senhor". Fez testamento.

Óbito de Antonio Fernandes

E Ana de Figueiredo enterrada dentro da Igreja de frente da porta. Não fez testamento. O cura de então era o Padre António Lopes de Andrade.

Óbito de Ana Figueiredo

Forninhos tem uma grande história humana, mas é preciso recuar na pesquisa de séculos atrás para se compreender a nossa génese.