Agora os tempos são outros, há quase tantas maquinetas no céu como estrelas este tem, porventura menos certeiras no dizer se vai chover amanhã que a sabedoria popular antiga que por esta altura do Outono a que alguns chamam de Primavera do Inverno, se precaviam de modo ancestral para afrontar estoicamente o frio e a mingua que este acarretava.
Bem de primeira necessidade, a lenha essencialmente dos pinheiros que eram sagrados pela riqueza das bicas de resina e por tal quase intocáveis. Tempos difíceis em que a própria caruma era regrada, tal como as giestas para fazer o estrume orgânico para as sementeiras e por tal, por estes dias moribundos de sol, muitos iam apanhar os tangos (ramos secos dos pinheiros, mas muito altos) para provisionar a casa de lenha, nada se perdia, desde os molhos de caruma, os das vides da videiras podadas e as sacas de pinhas. Nem os carolos do milho, logo o canganho da vindima iria virar aguardente no alambique.
Outras iam mais longe, subiam a serra e iam até à Farrangeira em busca dos sorgaços e suas raízes.
E assim surgia a fogueira acesa na lareira, com ramos verdes e secos, conforme a possibilidade e em volta da qual se soltava a alma de um povo, mais ligeiro enquanto ardia e se assavam umas batatas e cebolas rachadas cobertas de cinza, por cima umas brasas e que iriam acompanhar um conduto qualquer, ou não, para a ceia que tardava tal como o "graças te damos Senhor por esta refeição que nos acabaste de conceder...".
Enquanto se arrumava a cozinha, recordo o meu avô a colocar algumas cavacas secas na fogueira para fazer um bom "brasiol", brasas vermelhas e intensas que iriam durar noite adentro, mais que o nosso negar de sono que na primeira história dele esmorecia a nossa resistência e no boa noite ensonado íamos viajar para o vale dos lençóis...
Chegava finalmente o remanso, portas e janelas deixavam escapar pelas frinchas o pronuncio do Inverno, mas na cozinha quente era agora ao borralho que pausadamente se falava da vida pessoal e dos outros, o contar do que se foi ouvindo no campo, alegrias e tristezas e do feito e do que haveria a fazer no dia seguinte.
Ainda bem que as crianças há muito dormiam, não fossem ouvir o deitar de culpas de coisas acontecidas por feitiçarias, nem barulhos da noite provocados pelo lobisomem, pois lobos e raposas eram coisas banais. Falavam que um homem da da aldeia havia morto um vizinho à sacholada...tudo isto enquanto no assador iam estoirando as primeiras castanhas, se cosiam umas meias de lã e começava o treino da roca de linho e a panela grande de ferro, aproveitava o calor para cozer a vianda dos porcos para cevar para a matação....
Recuado no tempo, aprendi o significado da palavra "antanho", por tal estas coisas não esquecer vou procurando coisas de outrora sem registo histórico lavrado em papel, mas nas memórias e que vai perdurando.
Hoje e a propósito do tema, recebi uma "prenda", porventura uma saborosa e genuína crendice de que poucos se devem lembrar ou ouvir falar...
Uma das coisas que por vezes se faziam ao borralho, quando uma mulher estava grávida, era pegar numa castanha que estava meia oca, vazia, digamos e que tivesse acoplado um rebento a que chamavam "filho" a que chamavam de "bonequinha" . O intuito era saber se a grávida tinha no ventre um menino ou menina e para tal, cuspiam na castanha e colocavam esta sobre uma brasa da lareira e esperavam...se esta desse um estoiro ao rebentar, era menino, se desse um bufo, era menina!
Bom, já taparam as brasas com cinza, querem ir dormir.
Boa noite.