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sexta-feira, 31 de janeiro de 2020

"Castelo", um mito secular

Para Fernando Pessoa, o mito é o nada que é tudo. Para Almeida Garret, trata-se de uma palavra grega que em tudo se mete e com a qual se procura explicar o que não tem explicação.
Os dicionários, consideram-no um feito fabuloso atribuído a divindades ou personagens desfiguradas; para ensaístas, trata-se de narração de factos ou tempos que a história não esclarece e contendo ora um facto real convertido em noção religiosa, ora a invenção de um facto com o auxílio de uma ideia.
Chegados a este ponto, afinal o que é o "Castelo"?
Simplesmente um monte alto, o monte mais alto da minha aldeia, onde está a cadeira do rei.
Hoje sei que foi um lugar fortificado das épocas pré-romanas e romana, na Penísula Ibérica, que era um povoado permanente e um refúgio das populações circunvizinhas em caso de perigo, também designado de castro, citânia, civita, forteleza, etc.
Mas vão lá vocês dizer isso a uma criança de oito anos nas décadas de  60 e 70 ou a jovens de 18 dos anos 40 e 50?

foto de Ilídio Marques, no Castelo-Forninhos

Como se fosse uma espécie de chamamento acima do real...
O "Castelo" era uma das maiores atrações da nossa meninice e como tal, ligado a uma época de juventude; gerações e gerações imaginaram ali encontrar o tesourou do Ali Babá e daqui gritaram o"abre-te-sésamo", embevecidos pela lenda da grade e cambão de oiro por ali enterrados que encantava as crianças que nós éramos ou da moira encantada que numa noite especial penteava os seus longos cabelos ao luar.
Era a nossa maravilhosa cultura popular a impressionar-nos...
A gente desta foto (Adriano Moreira, Zé Pina, Samuel Cavaca...rapaziada agora para os 80, 75 e 65 e mais)  "viveu"  de certeza o encanto do "Castelo".
É nós hoje? 
Fico muito feliz quando vejo promoções de caminhadas pela nossa Serra (esta e outras) para apreciar as suas belezas, mas será o suficiente?

sábado, 25 de janeiro de 2020

ERA DIA DE PASSEIO...


A senhora catequista dizia que o sítio que íamos visitar, era coisa de reis e rainhas. 
- Mas vamos mesmo ver um lugar aonde houve reis?
Era um mergulho no tempo das nossas fantasias, nós que tinhamos sido criados por vales e montes, bárbaros ao fim e ao cabo, rudes no sobreviver, a maior arma o arado, aquele que pungia a terra e semeava.
Agora o passeio,...dava que pensar, íamos ver gentes diferentes e lugares, até diziam que íamos ver o mar...
A gente tal não havia visto, e digo que nem gostei, um barulho medonho, que nem me dexava dormir na saudade dos meus pardais, aqueles à beirinha da casa.
Certo, nem sei bem como dizer, aquilo que a gente tem, sabe tão bem...
Na foto, fomos meninos a conhecer o mundo vestidos por nossas mães que nos costuravam na cozinha para irmos a preceito, por vezes até de madrugada, já a meia luz com os olhos cansadas do no subir das bainhas.
Cama cambada que amanhã é dia de passeio!
E assim se acomodaram, em sonhos...

-/-
Da mesma série das excursões da catequese ao Buçaco a foto foi oferecida pelo Ilídio Marques que era o pároco nessa altura.

domingo, 19 de janeiro de 2020

Pe. Virgílio, um padre de má memória

Sendo o sexto de oito filhos, Virgílio Lopes nasceu em 1931, em Colherinhas, freguesia de Dornelas, concelho de Aguiar da Beira. Era filho de Joaquim Lopes e de Antónia Gomes.
Depois de concluir a Primária na escola local, ingressa ainda adolescente no Seminário de Fornos de Algodres. Em 1949 frequenta o Curso Preparatório e de seguida o Curso Teológico no Seminário Maior de Viseu.
Pela mão do Bispo D. José da Cruz Moreira Pinto, é ordenado Padre num Domingo de Ramos, 25 de Março de 1956, na Sé de Viseu e inicia o exercício sacerdotal.
Veio para Forninhos no ano de 1957, depois da saída do Sr. Padre Valdemiro e era conhecido por Padre Grilo.


Em 1959, decide fazer obras na Igreja Matriz (teto) e na Capela de Nossa Senhora dos Verdes (retábulo e teto). Um seu irmão que era marceneiro e carpinteiro foi quem fez as obras, mas  durante as mesmas sumiram dois valiosos castiçais, que a nossa gente apelidou de "Serafinzinhos". Ainda hoje muitas pessoas do tempo dizem que foi o Padre Grilo que os levou para Espanha. E este "roubo" nunca lho perdoaram os seus paroquianos.
Mais, aquando da sua passagem por Forninhos, ainda consta que gostava de espreitar as pernas das raparigas quando estas subiam aos altares para os limpar e enfeitar, isto para registarmos que constou na sua terra natal que, mais tarde, teve um filho ou filha (será verdade?).
Em paralelo à ação sacerdotal prossegue com a sua formação académica na Universidade de Navarra, em Pamplona, Espanha, na década de 1960, através do "Opus Dei"!
Volta a Viseu, após a Licenciatura e o Doutoramento em Direito Canónico. Através da "Opus Dei" dirige uma residencial de estudantes que acolhia rapazes e quando sai do "Opus" mete-se nas Misericórdias Portuguesas (UMP) e preside ao Secretariado Nacional; diz-se que fez um excelente trabalho. No entanto, há quem diga que "se o Doutor Virgílio Lopes foi o fundador das Misericórdias o Padre Vítor Melícias foi o salvador".
Na sua qualidade de Presidente da UMP ainda promoveu e acompanhou a construção do Centro de Deficientes João Paulo II.
Faleceu em 1991 - em Fátima - tinha 60 anos - mas o seu percurso por Forninhos, as tristes cenas nunca vieram a público.
A missa exequial pela sua alma foi celebrada a 5 de Outubro na basílica do Santuário, tendo daí seguido o séquito para o cemitério de Fátima, onde, por sua vontade, foi sepultado em jazigo oferecido pelas Misericórdias.
Ele que depois de sair de Forninhos ajudou todas as suas sobrinhas a se formarem (quando ainda pertencia à "Opus Dei"), ele que "só queria para ele e sua família", estranhamente não quis ser sepultado na sua terra e ficar junto dos seus. Mistérios!
Há quem diga que viveu e morreu atormentado.
Mas Padres Grilos, em Forninhos, nunca mais!

domingo, 12 de janeiro de 2020

O Baptistério

Jesus foi para a Galileia para o rio Jordão, a fim de se encontrar com João e ser baptizado por ele.
E dos céus ouviu-se uma voz: "Tu és o meu filho muito amado, em Ti pus toda a minha complacência".
Com a Solenidade do Baptismo do Senhor, hoje, Domingo, dia 12 de Janeiro, se conclui o tempo de Natal.
Começa agora o Tempo Comum.

Painel de Azulejos do Baptistério
Antes do Natal, fui à nossa igreja, depois de ter sido alertada que o Menino Jesus do vestido agora até tinha uma pequeníssima coroa; é verdade, mas como para mim já não é a imagem do Menino Jesus de antigamente, podem por isso vesti-lo e coroá-lo à vontade...
O que vos quero mostrar hoje é um cantinho antigo que merece todo o nosso carinho: O baptistério, uma obra em pedra que fica do lado esquerdo, da entrada da igreja.


Que felizmente ainda não descaracterizaram...ainda não se lembraram de cobrir ou tirar o seu chão de pedra, modificar a pia baptismal ou o painel de azulejos, mas não sei até quando...quando há dinheiro...para azar o genuíno não interessa a ninguém.
Do chão de pedra da Igreja de Forninhos já só resta este cantinho e o altar-mor (parte do Sacrário).
Na próxima visita à Igreja não deixe de repará-lo.



Quem de nós (forninhenses) não inclinou a cabeça para receber nela a água baptismal, neste lugar?
Todos nós por lá passamos, ao colo da madrinha, da mãe ou pelo próprio pé (estes poucos, mas há), com o padrinho e demais convidados.

sábado, 4 de janeiro de 2020

Luar de Janeiro...

Luar de Janeiro não tem parceiro...


Neste abrir do Ano Novo trago-vos um pedacinho da noite da Beira Alta (há 100 anos):

"Seria obra de dez horas e caía uma geada muito forte que sobradava os agros e metia pela terra dentro suas agulhas de gelo. No céu, adiante de cirros, ia de jornada uma lua bochechuda. E tão estanhada, que os barrocais luziam até muito para riba do povo, donde as águas manavam, glau! glau!
Os longes esfarelavam-se num luaceiro grisalho, como de moinha ao vento; mas, a todo o largo da mirada, a terra descobria-se com os mouchões das leiras a reluzir prateados ao luar e os regos coalhados de tinta negra. Nas leiras onduladas de morro para morro, o centeal dormia debaixo do codo, a meio as pedras intonsas e impressionantes, como cabeças mortas saindo de baixo dum lençol. As giestas projectavam uma sombra muito escura, o que levou a notar que a sombra que o seu vulto também projectava era tão retinta e desengonçada como se levasse um fantasma à mão direita. Não se enxergava vivalma, nem de homem, nem de bicho, nem de ser nado que fosse.
Mas pela lua que caminhava sempre, o sete-estrelo muito rútilo, a rija imobilidade da planície, sentia-se a terra presa a amarras que não quebram nem se rendem".

-Terras do Demo, obra de AQUILINO RIBEIRO editada em 1919.