Recordo hoje algumas histórias populares que faziam parte do
dia a dia da nossa aldeia, mas semelhantes às de qualquer aldeia de há 50 e tal anos…que muitas pessoas depois contavam, à sua maneira, conforme as realidades da sua terra. Começo pela história dos pés endurecidos.
Havia um homem em Forninhos, lavrador, que segundo contam tinha os pés tão calejados e ressequidos por uma vida de trabalho de sol a sol, que uma vez a lavrar (ou a gradar) pisou um lacrau (escorpião) com o pé descalço e pensou que britou um ouriço, do castanheiro, que como se sabe têm picos agressivos. Parece mentira, mas não é. Era tal a dureza da pele, que britou um alacrairo.
História da velha que fez cem pipas de vinho só com bagos de uvas. Com o regresso do Outono, aconteciam as vindimas. Um dia para um, logo a seguir para outro. Os cachos eram cortados pelas mãos de homens, mulheres e crianças. No tempo que eu era criança em Forninhos, esta história tocou-me a mim algumas vezes.
Explicando:
Quando o calor começava a apertar, já não apetecia vindimar, muito menos apanhar os bagos do chão, então logo ouvíamos uma chamada de atenção de alguém mais velho:
- Vamos lá meninos, toca a apanhar também os bagos do chão.
- Olhem que uma velha no Douro fez cem pipas de vinho só com os bagos…sabiam?
Coitada da velha…fartou-se de apanhar bagos do chão, pensávamos! Longe de nós pensar que todo o vinho só é feito com os bagos das uvas.
Nos trabalhos agrícolas, um dos instrumentos mais usados ao
longo dos tempos é o ancinho e quem conhece as lides da lavoura sabe bem o que
é. Aqui a mãe pede ao filho que veio à terra pela primeira vez,
depois de ter-se acomodado à vida da cidade:
- Ó filho dá-me cá o ancinho.
O filho com cara de quem já não sabe o que é e para que
serve, pergunta:
- O que é um ancinho?
E no mesmo instante e antes da mãe lhe responder, põe o pé
num dos dentes e o cabo comprido bate-lhe com toda a força na testa.
- Porra do anchinho – disse enquanto esfregava a testa.
- Ora vês como t´alembraste?! Disse a mãe ao filho.
A história da Pêdra
Esta história passou-se num dia de festa de Agosto. A Pêdra, Belmira
de seu nome, na véspera da festa deitou-se para dormir a sesta. Acordou, preparou-se para a festa. Quando os vizinhos viram a Pêdra tão bem preparada perguntaram-lhe:
- Para onde vais Pêdra?
- Vou para a festa. Respondeu.
- Então! A festa já foi ontem!
Às vezes duplicavam o sono e diziam-nos que a Pêdra dormiu
dois dias seguidos. Ainda hoje quando alguém dorme demais ou acorda tarde, se
diz “és como a Pêdra” e/ou “ía acontecendo-te como a Pêdra”.
Da festa de Agosto, para recordar, publico uma foto da geração adulta do tempo em que eu era criança.