Porque será que o pai Paulo, trouxe o seu filho Dinis, a pescar junto ao moinho do Bombo, nos Valagotes, ele homem de Sintra, que quando vem a Forninhos traz aquele bom marisco apanhado ainda de noite? Por o filho ser neto da terra.
Doces lembranças que vão esmorecendo a cada ano que passa, mas felizmente que por aqui a natureza tem sido poupada aos terríveis incêndios e visto à distância, aparenta que tudo continua um idílico paraíso. Quem dera!
Temos lindos ribeiros e ribeiras e então o rio Dão...diziam que este ano tudo andava a ser limpo, margens verdejantes, águas límpidas, boas pescarias e por aí fora...por isto, no final da primeira semana de Agosto, resolvi ir "à partida".
Planeei a coisa quase em segredo por me terem dito que em Cabrancinhos não ia valer a pena; o peixe tinha desaparecido nas águas paradas cobertas de limos. O ribeiro já não tinha obrigação de nada, o Moinho da Carvalheira já morrera, para que gastar dinheiro...
Fui a Cabreira sozinho, pelas 3h duma tarde quente, mas quente. Houve quem me chamasse louco por ir àquela hora, ainda por cima sem companhia, mas fui... e no lago da levada que outrora regava a várzea dos meus avós, nem sinal de peixes, mesmo com o chamariz do engodo, ali que outrora, com uma simples vara de amieiro, bastava fio e minhoca no anzol, se levava para casa uma boa refeição. Aquilo estava morto, nem sequer uma rã ou uma cobra ribeirinha que tanto nos assustava quando por debaixo da levada apanhava-mos o embude para pisar e "almariar" os peixes nos pequenos charcos que ficavam secados pelos motores de rega que tinham regado o milho. Aí sim, uma farturinha, como tínhamos coragem de meter as mãos por debaixo de pedras e tocas de raízes. Ainda tenho a marca no indicador direito, cobra, rata ou enguia, sei lá...
Perplexo, segui Ribeira de Cabreira abaixo, ladeando como podia por cima de pedras, silvas e giestas, sendo que às tantas quase me perdi, até encontrar o Lagar do Senhor Luisinho. Registei no telemóvel (se por ali me ficasse, por ali tinha andado) e fui descendo em direcção ao Rio Dão, pensava, pois por entre poucos troncos e muita ramagem seca, presumi que do tal trabalho de limpeza este ano tudo estaria limpo, mas adiante...
Num charco maior, mirava se havia peixe, caramba, outrora era uma farturinha e assim fui andando até à Revolta, porca, imunda, aquele sítio que outrora fora um "praia" fluvial, aonde tanta criança aprendeu a nadar e que com canastros camuflados com verdalheiras, bogas e barbos eram apanhados e nós crianças fugidas da escola, éramos desculpados pelos pais, por levarmos para casa uma boina cheia de peixes.
Pensei, apenas restava o Poço dos Caniços, ao lado, logo abaixo. Estava mais airoso e limpo do que imaginava e fiquei contente. Também não me tinha perdido, a Ponte da Carriça estava a poucos metros, portanto, estava no mundo e a pescar no meu rio Dão. Aqui sempre houve peixe e grande, barbos valentes que as bogas ficam lá mais acima...
Eram quase 7h da tarde, 4h palmilhadas e as pernas marcadas pelas silvas e pergunto a dois senhores que sentados pescavam o farnel de cana de pesca encostada.
- Companheiros, está a dar peixe?
- Meu caro senhor, se o senhor vem donde eles nascem...e nada trás...
Arremeti caminho, direito a Forninhos; mais tarde soube que se tivesse andado mais dois quilómetros em direcção à Quinta da Ponte, talvez tivesse sorte, estava o Dão mais limpo e ali já pertencia ao concelho de Penalva.
Fiquei a pensar, como uns concelhos podem ser mais limpos que outros, mas querendo, ainda se vai à pesca e vai havendo peixe...