A azeitona já está preta/já se pode armar aos tordos/Diz-me lá, ó cara linda/como vamos de amores novos. Esta canção popular não fica por aqui, mas basta para anunciar que em Forninhos a azeitona já está madura, pelo menos, para curtir!
No mês passado escrevi sobre a sementeira do pão. Hoje, sobre o azeite. Mas nada que se compare, enquanto quase todas as famílias semeavam pão, poucas eram as que supriam as suas necessidades em azeite.
Ter oliveiras, ter azeite, significava se uma família era pobre, remediada, abastada ou mesmo rica, ou seja, para essa classificação contava o número de oliveiras, se eram colhidas pelos próprios com ou sem ajuda de familiares e amigos, ou se a colheita era simplesmente efectuada como trabalho assalariado.
Mas lembro que muitas famílias por não terem oliveiras suas, saíam ao rebusco. A tradição do rebusco, era uma das mais bonitas da nossa terra, sobretudo por parte daqueles que deixavam ficar parte do pouco que tinham, pois na época (anos 40, 50...por aí) não seriam muitos aqueles a quem sobrava alguma coisa.
Porque para compreender o presente é preciso primeiro conhecer o passado, não resisto em destacar aqui as palavras de alguns bloguistas, contribuidores, visitantes, conterrâneos. Alguns, hoje, não vão achar bem, mas tem de ser:
«Os meus pais não tinham oliveiras, no entanto, todos os anos faziam um bocadinho de azeite, não era muito, mas faziam, e para isso, eu contribuía; quanto eu e outras crianças vínhamos da escola ou aos domingos antes de ir para a missa, pegávamos num cestinho e lá íamos ao rebusco da azeitona, era catada no meio das ervas e quando se via algumas esquecidas em cima da oliveira, subíamos, e com uma varita deitava-se abaixo, tendo atenção onde caía para depois se ir apanhar.».
«Quando eu era criança, os meus pais cultivavam terrenos que não eram deles, pois só depois dos meus avós falecerem é que ficamos com terrenos nossos. Nos terrenos que não eram nossos só se cultivava a terra, as azeitonas e as uvas eram para o proprietário apanhar, mas depois de ele fazer a apanha lá íamos nós com os cestitos de vime para o rebusco, mais para a azeitona para fazermos o azeite e para curtir, era pouca, mas um bocadinho aqui, outro ali, se fazia um bocadinho de azeite e curtíamos umas azeitonas num pote de barro.».
«Depois tínhamos direito às batatas, mas com pouco azeite. Às vezes punha-se a panela das batatas em cima da mesa. No meio da mesma encontrava-se um prato onde o azeite flutuava no cimo da água. Tínhamos direito de pegar nas rodelas das batatas e de as molhar no azeite mas só de um lado, para poupar o azeite.».
«Sou do tempo em que todos comíamos as batatas de uma bacia, era assim que se chamava a uma travessa de barro de forma arredondada, para poupar o azeite!».
Da importância da colheita da azeitona e do fabrico de azeite falam também os dois lagares de azeite que chegou a haver em Forninhos que, em dois ou três meses por ano, muito duros e de trabalhos esforçados, alguns homens trabalhavam...
«Em forninhos no passado, existiram dois lagares de azeite, movidos por força da água dos ribeiros, um pertencente ao Sr. José Baptista, outro ao Sr. Luísinho Abrantes.
O pertencente ao Sr. José Baptista não o conheci a funcionar, pois uma cheia tenebrosa o destruiu, mas o do Sr. Luísinho Abrantes conheci-o muito bem a trabalhar em pleno. Forninhos produzia azeitona abundante e por isso o lagar laborava bastante tempo. Abria normalmente próximo do Natal, alguns, os mais necessitados, já se valiam do azeite novo para fritar as filhós e temperar as couves, batatas e bacalhau da Ceia da Consoada.
Depois da azeitona apanhada, vinham os ensacadores ensacá-la para ser transportada para o lagar. Nas sacas, lembro-me, punha-se um sinal para não haver misturas com sacas de outros no transporte para o lagar.».
«Eu só me lembro do Lagar do Sr. Luísinho, onde passei algumas noites sentado à lareira a ver as pedras das mós a esmagar a azeitona, o enchimento das ceiras com a massa da azeitona e a comer batatas, cebolas e bacalhau assados, regados com muito azeite quente tirado das pias. Quando íamos a pé, passávamos o ribeiro por um pontão de madeira muito escorregadio, que existia ao lado do lagar; outras vezes íamos no carro de bois juntamente com a azeitona e quando o ribeiro levava muita água, a travessia era difícil e perigosa, pois não havia qualquer ponte.».
«O Lagar de Azeite do Sr. Luísinho Abrantes, fez com que a minha mente recuasse cerca de 7 décadas, lembrando-me da travessia do ribeiro, que eu ainda rapazinho, o lavrador do Sr. Luísinho me autorizava a viajar sobre as sacas da azeitona e que um dia, já ao escurecer, houve grande dificuldade para atravessar o ribeiro, porque tinha havido uma trovoada e o nível da água subiu mais do que se esperava. As batatas à lagareiro, além das cebolas, babalhau e azeite, tinham a ajuda dos garrafões de 5 litros. Nesta época o Lagar do Sr. Luísinho era o mais moderno entre os quatro da nossa área: o lagar do Dr. Varela de Dornelas; o lagar da Matela Velha e o lagar do Sr. José Maria de Almeida em Sezures, este era movido por bois. Quanto ao lagar do Sr. José Baptista, salvo erro, no meu tempo já não funcionava.».
É, consta que esse lagar, foi desactivado em 1938, porque no dia 8 de Setembro desse ano, uma forte trovoada desabou sobre o nosso concelho; os rios e ribeiros cresceram assustadoramente e o lagar do Sr. José Baptista desmoronou-se.
Na minha terra natal, ainda todos os anos quase todas as famílias fecham as portas para ir apanhar a azeitona, para consumo privado, mas hoje levam-na para um qualquer lagar das redondezas e bem vistas as coisas Forninhos é que perdeu/perde.