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sábado, 14 de novembro de 2020

Um Padre "Miguelista"

O reinado de D. Miguel foi curto e conturbado, mas em torno dele gerou-se um fenómeno de idolatria que se traduzia num exagerado culto ao seu retrato - a "real efigie". Mesmo antes de se tornar rei, já circulavam milhares de imagens suas aplicadas em broches, caixas de rapé, alfinetes ou medalhas.
Rapidamente entendido como uma arma política, o que começou como uma moda extemporânea, tornou-se uma obrigação após a subidade de D.Miguel ao trono.
Os cidadãos deveriam pedir ao soberano a mercê de usar a sua efigie e este tinha a prerrogativa de o autorizar...e mandar publicar na Gazeta de Lisboa!
El-Rei D. Miguel distribuia medalhas de ouro à sua base social de apoio e o símbolo de fidelidade ao monarca que ficou conhecido pelos cognomes "O Usurpador" e "O Absolutista"também chegou a Forninhos, pasme-se!!
Foi a 20 de Novembro de 1830 que o monarca concedeu o uso da sua real efigie, em ouro, ao Cura Lourenço Homem de Albuquerque, pároco de Santa Marinha de Forninhos
Fonte: Artigo/Comunicado da Gazeta de Lisboa, 26-11-1830.
Este padre, claro, foi apoiante do partido de D.Miguel, o que, em tempo de perseguições como aquele foi, nunca seria um bom sinal para Forninhos, já que o símbolo de fidelidade ao monarca, durante as Guerras Liberais, ameaçava a segurança e a vida das pessoas. Um abade da Matança, de nome Garcia ou Barros, foi assasinado no momento em que celebrava missa, em dia de S. Bartolomeu. Podem ver o acontecimento horroroso aqui
Sobre a Guerra Civil Portuguesa, de 1832-1834, também conhecida como Lutas Liberais, Guerra Miguelista ou Guerra dos Dois Irmãos, vidé:

 

Houve mais medalhados e medalhas que "O Rei Absoluto" era um mão-largas...
O Reverendo da Villa de Figueiró da Granja, Abbade da Igreja de Nossa Senhora da Graça, por exemplo, também foi medalhado.
Mas quem foi Lourenço Homem de Albuquerque?


Assinatura do Cura "Miguelista"

Nos registos paroquiais, por vezes, encontramos diversos párocos quase em simultâneo, pelo que não é fácil assinalar a data em que um termina e outro começa. Mas...Lourenço Homem de Albuquerque paroquiou a freguesia de Forninhos de 1820 a 1832, doze anos, portanto. Em 1833 veio paroquiar esta freguesia o Cura Belchior Luiz do Amaral (1833-1837), seguido do Cura Pe. Manoel de Barros (1838-1840)...

Já agora as medalhas de "filiação política":



Alfinete Miguelino

Na monografia de Forninhos no capítulo "Invasões e Liberalismo" há uma informação que dizem datar de 27 de Novembro de 1830 que diz isto:
"Neste dia a Gazeta de Lisboa noticiava que o Rei D. Miguel tinha concedido no dia 20 desse mês(...), o uso da Sua Real esfinge, medalha em ouro, ao reverendo Lourenço Homem de Albuquerque, pároco de Santa Marinha de Forninhos, pertencente ao Bispado de Viseu. A notícia é parca em informações pelo que não nos foi possível apurar qual o motivo de tal honra."(sublinhados nossos).

Primeiro- a informação data de 26 de Novembro de 1830 e não 27 de Novembro, conforme se prova com  folha numerada com o nº 1142:


Segundo- O motivo de tal honra!!!  Não se trata de sinal de honra, mas sinal de pertença, como elemento ativo numa guerra. O Padre de Forninhos, foi um dos muitos que se permitiu pedir ao usurpador do trono, a mercê de usar o penduricalho de propaganda da causa miguelista, digo, a sua efigie (e não esfinge como se lê). 
Segundo o dicionário Priberam Esfinge é um monstro fabuloso com a cabeça humana e corpo de leão. Já Efígie é um retrato, imagem, figura de um indivíduo. 
Algumas vezes, as pessoas pronunciam "esfinge" ou "efinge", mas Historiadores de "alto gabarito" confundirem o termo...é Obra!!
Mas isso é outra história...

Fontes: 
Gazeta de Lisboa

13 comentários:

  1. Conhecer a fundo a história da nossa terra é muito interessante.
    Abraço, saúde e bom fim de semana

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    1. Este artigo é apenas mais uma achega.
      Não fora a gente saber o que representou D. Miguel e a "real efigie", seria um orgulho um pároco da nossa terra ser merecedor de usar uma medalha de ouro d'um Rei!
      Bom fim de semana.
      Abraço, saúde.

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  2. Boa noite Paula,
    Os meus aplausos por mais esta interessante e importante pesquisa para a História de Forninhos.
    Gostei de saber de alguns pormenores sobre o uso da efígie do Rei e a idolatria ao mesmo, que desconhecia, uma vez que antes do 25 de Abril de 74 a História e outras matérias eram-nos ensinadas só no que ao governo interessava. O importante era manter o povo ignorante.
    Um beijinho e bom fim de semana.
    Ailime

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    1. Ainda hoje, em Forninhos, é assim...
      Um padre do passado usa o retrado dum Sr. que usurpou o trono e fazem-nos crer que tal é motivo de honra!!
      "Santa Ignorância"!
      Eu fui para a Primária já depois do 25 de Abril e fui sem qualquer conhecimento de que muitos foram os métodos e manuais de ensino utilizados ao longo dos séculos, mas sempre gostei muito de História e, por isso, custa-me muito ler as mentiras sobre a história e a memória da minha terra natal.
      Expresso-me como melhor entendo, mas sei que não posso obrigar ninguém aceitar a Verdade dos Registos porque sei, também, que a lealdade das pessoas - que continuam apoiar uma mentira - não deixa ver a Verdade.
      Beijinhos e bom domingo.
      aluaP

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  3. Mai um excelente trabalho de investigação acerca de coisas nossas, memórias.
    Afinal hà muito a procurar, as tais pedras que como costumo dizer, levantadas soltam cobras e lagartos e não apenas lendas e sonhos, mas sim coisas reais e nefastas.
    Porventura tempos da escuridão na alma de este padre, sucumbido ao esplendor e orgulho de uma figura patética mas mandante que lhe dava o sortilégio de ostentar o poder material e moral.
    É bom procurar na história as loucuras de D. Miguel e as ajustar aos novos tempos.
    Mais dias tivesse o ano, mais comendas havia a distribuir e pendericalhos pelas aldeias.
    O problema é que a erva daninha continua a medrar, tipo "erva pasqueira" que agarra e não despega...
    Padres destes e similares, indepentemente dos séculos, o diabo que os carregue, pois vieram para serem pastores e não lacaios fartos pelo reino e bem medrados.
    Quando referes a monografia de Forninhos, tal desconheço por respeito ao termo, mas gostva de analisar, pois um trabalho monográfico envolve a exploração extensa de um assunto em particular, obedecendo a rigorosos padrões metodológicos.
    Ora com tantos trocadilhos semânticos e não só, as nossas almas no seu dia em vez de sufragadas pela Irmandade, seriam dolorosamente enfragadas.
    Ainda hoje e isso é que dói, continua a mesma guerra fraticida, aliciada por caricas que simulam condecorações, atribuidas a tantos Lourenços...


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    1. Acho que a maioria dos padres católicos daquela altura professavam ideias miguelistas, mas daí a usar os penduricalhos - que não eram prestigiosos, antes eram perigosos - é de loucos!
      A história de Forninhos está cheia de padres Lourenços e neste novo século, das comunicações e conhecimento, as melhoras nao têm sido muitas, infelizmente.
      A limitação e controle das redes sociais, são estratégias que os novos usurpadores utilizam para levar as pessas a agir de acordo com os seus interesses.
      Sublinho "limitação e controle das redes sociais".
      A esses não interessa que as pessoas opinem e pensem pelas suas próprias cabeças.Tu, por exemplo, podes opiniar nas páginas facebookianas que até usam o nome de Forninhos?
      Só os usurpadores se apoderam do que não é seu!
      Só lhes falta começarem a distribuir também uns penduricalhos aos seus apoiantes ;)
      Bom...só quem conhece a realidade sociológica de Forninhos!

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    2. P.S. Houve erro de transcrição do documento original dos estatutos da Irmandade e embora não tenham mencionado a fonte, os monografistas escreveram também "enfragar" em vez de sufragar. Isto é grave para quem inicia novos trabalhos monográficos.
      Por isso é que eu não gosto muito de monografias, copiam-se uns aos outros e os erros mantêm-se durante anos e anos...

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  4. Boa noite Paula. Muito obrigado pela excelente aula de história. Parabéns pelo trabalho de pesquisa.

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    1. Obrigada.
      A História desta malfadada época está contada em muitos livros, pelo que não me compete a mim escrevê-la (que nem sequer sou historiadora) só que sou forninhense e é nessa qualidade que me interessa repôr a verdade.
      A folha da Gazeta de Lisboa que se publica tem a data de 26 e não 27 de Novembro de 1830, mas isto até considero um erro de simpatia, já "A notícia é parca em informações pelo que não nos foi possível apurar qual o motivo de tal honra" não é desculpável. A "esfinge", idem.
      A nossa história e tradição, anda tão mal contada, que o culto ao retrato de D. Miguel, em Forninhos, até passou a ser motivo de honra!

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  5. Um trabalho de investigação que merece o nosso aplauso e que nós gostamos de conhecer!
    Bom domingo!

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    1. Muito obrigada, Gracinha.
      Ainda acrescento mais: um padre que paroquiou Forninhos durante 12 anos e não se lhe conhece uma obra e ainda acharem poder ser merecedor de alguma honra, quando apenas ostentava ao peito a "real efígie" de D. Miguel e com isso pôs em perigo os seus paroquianos, é mas é motivo de anedota.
      Pelo menos os párocos que vieram a seguir mandaram construir o alpendre da nossa Capela, segundo data gravada em pedra (1838).
      Bom domingo,bjo.

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  6. Um relato cheio de coisas interessantes e culturais, ótima pesquisa, Paula.
    Você é uma estudiosa e como ama detalhes e pormenores... Aliás, você e o Xico são historiadores e garimpeiros de aventuras!
    Abração... Feliz semana para vocês...

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    1. Anete,
      Ainda vamos descobrir que o Rei D. João V, que também foi um monarca absolutista, mandou procurar ouro em Forninhos!
      Nunca se sabe...
      Abraço.
      Boa semana.

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