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terça-feira, 23 de janeiro de 2018

O tio Venâncio, caçador lendário...

Merecia um rua com o seu nome, na mesma onde morou e enfrentou a vida.  Acomodou filharada sem jamais fugir às necessidades do sustento dos seus. Bom homem o tio Venâncio, figura real de Forninhos; um marco!


Afinal quem foi o tio Venâncio?
Para tal devemos recuar aos primórdios de Forninhos e da sua constituição como povo até aos dias de agora. Num lugar bendito como o nosso e apetecível, muitos povos por aqui passaram e o possuíram, desde a mouraria aos romanos, ou vice-versa, pois tantos outros aqui se regalaram... 
Os tempos, foram-se perdendo na memória deles mesmos por desmérito nosso, o que lá ia...lá ia.
Não está certo, temos obrigações, temos testemunhos vivos e não temos vontade de trazer por medos, as nossas raízes, aquilo que nos honra, como se fosse vergonha.
Homem simples e trabalhador, o tio Venâncio. Parecia ter sido companheiro de Viriato nos montes hermínios, tal a sua audácia.
Uma prol que não era pequena, carecia de um sustento e por tal ele madrugava para a sua faina de resineiro ao mesmo tempo que visualizava as "covas"  de onde porventura poderia advir acrescento, tal como uma várzea para os lados da ribeira.
Vamos ao que interessa pra o tema: O Raposeiro!
No seu dia-a-dia como resineiro, melhor que ninguém, conhecia pelas serranias os penhascos, desde a Portela, Cova da Raposa, até ao limite de Dornelas.
Sabia melhor que ninguém armadilhar, Eram lages que podiam pesar cinquenta quilos, armadas sobre três paus, o chamado triângulo e chincavam a presa.
Ele, o tio Venâcio, tinha a sabedoria de caçar as presas, sabia o que podia caçar e por tal na toca, melhor, na sua entrada, deitava fetos e se estes eram recolhidos, sinal de que era texugo, ao contrário da raposa.
Dinheiro valiam as peles os bichos caçados por necessidade. Esfolados, eram pregados com a pele contra as portas, antes esticadas e passadas com sal grosso e cinza. Um prego no focinho e outros nas patas e ficavam a curtir mais de oito dias, até Janeiro.
Podem dizer que barbaridades, mas tal ainda hoje nao entendem as nossas gentes, para elas galinhas e ovos, era uma benção que este senhor ajudava e por tal e quando apanhava uma raposa e a mostrava na aldeia, as pessoas reconhecidas davam o que entendiam por bem, ovos, batatas, cebolas...
A pele bem curtida, podia valer por cima na Feira Nova, 10 escudos...
Saudades, ti Venâncio!

Foto: cortesia da sua filha Fernanda.

20 comentários:

  1. Que lindo artigo sobre o meu avó. Muito obrigado

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    1. Eu é que agradeço ao seu avô pelas memórias que nos deixou.
      Lembro dele, claro, amigo do meu pai e de tantos outros, melhor, de todos!
      Este Senhor sempre foi dado ao respeito e quanto saiba, respeitado.
      Toca-me sentimentalmente que era e continua a ser o seu avô. Mais, ontem antes de escrever, falei via telefone com quem agora sei ser o seu pai, o Toninho Venâncio.
      Quer que lhe diga?
      Abençoado neto que teve um avô deste gabarito!
      Um abraço.

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  2. Contos e causos do Tio Venâncio que deixou histórias pra lembrar...abraços praianos,chica

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    1. Daria um livro, Chica...
      Ele que deixou uma lição de vida, nem imaginam.
      Este Senhor, esgadanhou as próprias entranhas do seu ser, como as serranias que trepava para as mais valias do seu e dos outros sustentos.
      Foi, sim, um beirão dos sete costados...
      Abraço.

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  3. É que jamais será esquecido se soubermos manter viva a sua história de vida!!!bj

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    1. Sabe Gracinha, pouco custa dar um bem-haja a quem e depois de tantos anos ainda alimente os nossos sonhos e o imaginário.
      Por mim e confesso, tantas noites que em miúdo ouvia o "choro" da raposa na serrania em volta da casa dos meus pais... tinha medo, claro que o bicho viesse, tal não bastassem os lobos nas noites invernosas, mas depois sentia no agasalho das mantas que o tio Venâncio me ia acudir; coisas reais.
      Beijinho.

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  4. Boas lembranças do tio Venâncio! Pelo que entendi, homem trabalhador e de vivas aventuras. A foto está comprovando o seu ofício corajoso.
    Um abraço amigo nesta quarta-feira

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    1. Amiga Anete:
      Este Senhor, um lutador.
      Na sua labuta diária, a resina, tinha por complemento a agricultura e a caça. Tinha acima de tudo, a dignidade de a seu modo e poder, dar comida para a mesa aos seus. Era um sábio, este homem, pois por tal conduta sobreviveu e os dele com ele.
      Um homem da serra e do campo, pergunto: Quantos restam?

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  5. Uma vida muito interessante.
    Abraço

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    1. A vida que a "sote lhe deu" e que filhos e netos agradecem por compreenderem os seu propósitos e necessidades.
      A vida tem destas coisas...
      Abraço.

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  6. Parabéns pelo Post!
    Melhor que o caçador furtivo Teutónio Louva-a-Deus de Aquilino Ribeiro que incendeia o pinhal plantado para se vingar dos Serviços Florestais, só o ti Venâncio (e eu adoro a personagem do Louva-a-Deus!!).
    Era um caçador exímio, o ti Venâncio! Um beirão, ligado à família, à terra, tradição e costumes. Merecia uma placa toponímica com o seu nome, na mesma rua onde morou? Fazia mais sentido do que "Travessa do Poeta" que não é um topónimo ancestral. Se ou menos a placa tivesse o nome do "poeta" ainda vá que não vá, mas não tem...
    Adiante...
    Esta foto, tirada em Forninhos, para mim é uma das mais bonitas e significativas que já vi. O meu agradecimento à sua filha Fernanda.

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    1. Sabes que por vezes me questiono se vale a pena contar coisas de outros, mas que em parte são "nossas" por fazerem parte das memórias de uma comunidade à qual pertencemos.
      Gostei de fazer este Post, sim, não apenas pela personagem, mas acima de tudo pela realidade da vida de então. A vida de nossos pais e avôs, o nosso embrião.
      Grande Homem para quem goste e eu gosto!
      Quanto ás placas toponímicas, vou averiguar o procedimento de tais "distintas" atribuições...
      Nem me digam que foram adquiridas por Usucapião?
      Exaltamos como sempre os frouxos e ignoramos os bravos.
      Esta foto de simbolismo tão forte, devia ter mais significado para as nossas gentes que os "tesouros roubados" por pesquisadores de livrete!
      Que "raio" obscura os nossos mandantes eleitos para transformar as nossas antigas escolas primárias num museu destas e tantas lembranças?
      Bastava falar com as pessoas, tal como fiz e seria um orgulho olhar e homenagear os nossos num respeito mais que merecido.
      Mas, a nossa sina, é sermos pobres, de espírito!

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    2. Claro que vale a pena.
      Há meia dúzia de anos tu mesmo escreveste que as nossas memórias, estão na gente que nos antecedeu (*) e nos vivos e nós temos obrigação de contar as suas histórias, defeitos e virtudes...
      (*) gente, pobre e remediada, pois não havia ricos, mas muito ricos de fraternidade...
      Portanto, o primeiro passo no rumo certo foi dado há muito, agora é só continuar seguir em frente, eu pelo menos, afinal sempre acreditei que “o caminho faz-se caminhando” e por isso faço questão de continuar a fazer esse caminho, em prol do conhecimento, salvaguarda, valorização e divulgação da história e memória da nossa terra - Forninhos.

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    3. E mantenho o que escrevi há anos: ricos são aqueles que ainda lhes sobrando um bocadinho do pouco, o partilham.
      Fazia e faz parte da nossa cultura, não ditada por doutrinas, mas por sermos gentes de bem.
      Ainda hoje dizem: esses eram pobres...
      Esses tais "miseráveis", eram um exemplo para os tais "ricos" que viviam isolados; sem amigos, tinham apenas o "dom" de mandarem e os que circulavam em volta, ufanos, a maioria sem saber ler nem escrever, achavam que tinham adquirido a sombra do patrão e por tal serem senhores do destino de outros que embora de casa montada e família, sabiam trabalhar e sustentar a riqueza.
      Sem preâmbulos nem medos, lembram a casa do Amaral?
      Porventura o rico de antigamente de Forninhos, vinhas resinas e compadre de Santos Costa, ministro da Defesa de Salazar.
      Hoje, já se pode falar disto, felizmente, mas ao tempo, discordância era falta de trabalho e comida na mesa.
      E era assim que aos poucos, quase pela calada, uns se iam remediando aos outros.
      Hoje as coisas são mais modernas, mas os olhos são os mesmos e volta e meia aparecem coisas do arco da velha, já não dos ricos mas quem a tal aspira a ser... depois as coisas agora já cabem na luz da verdade, á Justiça!

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  7. É bom lembrar estas "figuras" que fazem parte do nosso património colectivo.
    Um abraço e bom fim-de-semana.

    Andarilhar
    Dedais de Francisco e Idalisa
    O prazer dos livros

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    1. Francisco, não sendo por tal e pouco falta, passamos por uma rua e poucos ali encontram uma identidade.
      Já ninguém se senta num chafariz em amena cavaqueira e conta que na casa ao lado ou nas ruínas em frente, viveu fulana ou cícrano, pois no desfiar das lembranças, viriam coisas reais, alegres e tristes, mas que ao olharmos para o rosto dos seus netos: afinal aconteceu!
      Abraço.

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  8. Notável testemunho e grandiosa homenagem ao dignissimo
    Ti Venâncio.....
    É verdadeiramente arrepiante o que vocês aqui descrevem das
    vossas gentes.
    Conheci Forninhenses , como vocês bem sabem, que tinham
    vergonha do passado ...na vossa Aldeia.
    Quem honra os " seus" não tem que ter medo do Futuro.
    Muito menos do presente....
    Não tem que se esconder. Que disfarçar. Que omitir o seu
    nome de Familia. Nem na vida nem no Face.
    Quem honra o seu passado não tem que escrever anonimamente.
    Todos nós errámos. Todos nós temos " pedras nos sapatos" mas
    ter vergonha da nossa aldeia...da vida dos avós ...
    das suas "penas"....das zaragatas...das mortes ..da dor que eles provocaram ...da miséria...de tudo isso !!!
    Ter vergonha das nossas origens é caminhar cabisbaixo para o abismo !!!!

    No dia em que meu PAI faz 81 anos digo aqui bem alto que
    sou GOUVEIA de familia ....em todo o lado me conhecem por
    Gouveia e tenho orgulho em falar de Francisco , Joao ,
    Bela e Maria meus avós e que mesmo sabendo que a VIDA me
    foi adversa o " PATRIMÓMIO" que tenho, honra - os todos !!
    Nunca atropelei o que deles " bebi" ...
    Trabalho, empenho e honestidade.

    Continuem em contar com o Meu Abraço neste blog.
    Para a semana vou ao Funchal dar o beijo no meu " velho"
    Fica a informação para a " Cabaça " que ao que parece
    continua com vergonha de se mostrar !!!!!
    Ainda se fala de Trump....??
    Com tanta trampa á nossa volta..
    Viva a Forninhos ...


    Bom Domingo
    MG

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    1. Boa noite António, antes de mais leve um abraço ao senhor seu pai.
      Tenho a vantagem de ao falar consigo, é com alguém que conhece Forninhos, independentemente das "amarguras" que a vida ou alguém lhe ditou o que lamento, pois sinto que gostou desta aldeia, melhor, gosta e tenho a certeza!
      Aqui e ao longo de tantos anos, temos sido coerentes, audazes e (sem vaidade) fortes.
      Mais fácil seria numa cidade ou vila, em que a informação se dispersa, opinar ou criticar isto ou aquilo, mas na aldeia, a gente sabe bem os dissabores e impropérios às nossas pessoas, mas continuamos a fazer, ou pelo menos tentar concretizar, o nosso propósito: Forninhos e as suas gentes, nao podem ser esquecidos. Houve gente boa de mais que não merecem o esquecimento.




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  9. O Xico compreenderá que ir a Forninhos de comboio em 1989
    três meses depois de aterrar em Lisboa , sem estar preparado,
    ir a um triste funeral.Dormir numa aldeia , numa casa pobre
    ver as luzes ao longe da Matela , ao cimo, não dormir,
    regressar poucas horas depois, dormindo na viagem para não
    faltar ao trabalho ( Ticket Restaurant na Infante Santo)
    ....tudo isto antes de casar com a neta da terra...antes
    de entrar numa familia que vocês bem conhecem....
    Foi marcante....
    Forninhos tornou-se nos anos 90 para mim um lugar Mítico,
    longe de tudo , fresco e sobretudo o lugar de férias.
    Saboreei as minhas melhores viagens terrestres por esse
    IP3 noite dentro para aí passar umas horas de coisas boas...
    Não tenhais dúvidas que aos 52 anos não dormi em mais nenhuma
    aldeia, dormi em muitos lugares, sitios ou Lombos...
    Ficou o culto das gentes que me trataram bem ,a Ti Agostinha,
    a ver fazer bagaço , e tantas outras coisas boas..
    As chatas não falo , já as conhecem....
    Quando hoje em Portugal um genro matou um ex sogro á porta
    de uma escola ,envio daqui um grande abraço ao Julio "Grilo"
    nato de Forninhos , que me assaltou a vivenda e levou- me
    os filhos...pois bem ,onze anos e quatro meses depois ,aqui
    estou a dizer viva a FORNINHOS , e com os sogros que tenho
    actualmente valeu a pena fugir de tamanha crueldade ,imagine,
    Xico o que é saborear seis Natais com sabor Beirão sem ter
    vergonha de dizer bem de Forninhos á mesa de quem nasceu no
    Sobral a 12 km da vossa Aldeia.
    Amigo , Xico , permita-me apenas do último desabafo.
    A Ana minha companheira prefere o Alentejo , por isso , e
    só por isso ainda não fui a Forninhos ...mas um dia hei-de
    rezar na Senhora dos Verdes pelos Heróis que foram os Pais
    e Avós que deram a Forninhos Golfadas de Talento, Arte e
    Sabedoria...que se lixe " a mer..",ela existe em todo o lado.

    Grande Abraço
    MG

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  10. Boa tarde Xico,
    Estórias lindas de pessoas únicas, como o tio Venâncio.
    Gostei imenso de o ler.
    Beijinhos e boa semana.
    Ailime

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