Durante uma conversação, apercebi-me que do tempo em que os pobres batiam às portas da aldeia, a maioria de nós ainda não tínhamos nascido. “Mas expliquem-me lá melhor isso dos pobres”, pedi eu.
Os pobres eram homens que passavam por Forninhos anos a fio, três ou quatro vezes por ano, pouco se sabia sobre eles, vinham sem pedir mais do que as pessoas estavam dispostas a dar-lhe e dormiam em palheiras e pátios. Apresentavam-se sujos e andrajosos e ficavam o tempo que queriam, sem que os mandassem embora. Um dia acordavam e seguiam viagem para a próxima aldeia que os acolhia.
“De onde vinham, se tinham família, se alguém os procurava ou esperava”. Perguntei-lhes.
- O “Toninho das Palhoças” era de Maceira. Carregava farrapos e sempre que lhe falavam na Guarda (G.N.R.) fugia.
- O “Luís da Ablosa” era da Ablosa e porque tinha corpo que dava para trabalhar, fugia a sete pés quando lhe falavam em trabalho.
- O “Funfas” escolheu uma casita na Pardamaia para viver. Foi sapateiro e sabia o nome de todos da aldeia. Forninhos adoptou-o e parecia sentir-se bem, mas um dia desapareceu.
- O “Volver” não me souberam dizer de que terra era, apenas que carregava paus e era muito assustadiço e medroso.
- O “Paulo”, a aldeia conhecia-o assim, já velhinho morreu em Forninhos e aí foi sepultado.
"E mulheres pedintes não passavam em Forninhos?"
Apenas a recordação de uma conhecida por “a Ana das Courelas”, porque era dessa aldeia para os lados da Serra do Pisco, Trancoso.
É assim que pode nascer um artigo...e dei comigo a reflectir sobre a recência destas vidas de pobreza nestes anos, no tempo em que não havia o Banco Alimentar, IPSS ou subsídios.
Escolhi a fotografia em: http://tempocontado.blogspot.pt/
À época que a soberba foto nos inspira, a vida de pobre e pedinte não era fácil.
ResponderEliminarMuito tinha de caminhar para pedir a colaboração alheia e mesmo derreadinho, aceitava o destino sem revolta.
Não tinha família nem casa, nada que o prendesse, embora alguns recordassem vagamente de onde eram, daí os povoados, tal como Forninhos, lhes atribuírem a alcunha das suas pretensas raízes, como no caso da velha das Courelas e Luís da Ablosa.
Quando não, também dormiam ao relento, desde que o tempo estivesse a preceito ou acomodo não houvesse.
Em resposta ao seu mendigar, rara era a casa mesmo a mais pobre, aonde na falta de conduto não se arranja-se uma fatia ou côdea de pão estreme, ou por vezes uma simples sopa mesmo aguada, para aquecer o corpo.
Percorriam a pé romarias distantes, na esperança de que à fé dos romeiros se juntasse a obrigação da caridade.
Recordo o Funfas, habitando um mísero e exíguo casebre para os lados da Pardamaia e aí ia arranjando um tamanco ou outro, uma bota esfarrapada, tal como ele, que as pessoas entregavam para um concerto pouco abonatório, mas mais por caridade desinteressada.
Que interessante revisitar os pobres daquela ´época e lembrá-los até pelos nomes. No interior esses tipos são conhecidos pelos nomes, coisa que hoje, nem ao menos sabe-se nada deles. beijos,linda semana! chica
ResponderEliminarEstos pobres que pasaban por las aldeas pidiendo algo para comer como fruta y otras cosas. También los había que venían en la épocas de recolección y, de esta forma, ganaban el sustento y el hopedaje. Eso es lo que me contaba mi padre sobre estas personas.
ResponderEliminarAbraços e beijos.
Eu era miúda e já ouvia o nome "Luís da Abolosa" e "Toninho das Palhoças". Só guardei que eram "pobres" e cresci convencida que não tinham terra, daí somente uma descrição apoiada pela memória nos permite deduzir como seriam estes homens que eram os então considerados pobres ou pedintes.
ResponderEliminarApesar da condição económica de cada um eram cordiais, na medida das capacidades que tinham.
Sabe-se que o que juntavam ou o que lhe davam, era para consumir ali e não para acumular e levar em sacos. Haveria poucas excepções, mas alguns trabalhavam: de sapateiro. Caso do "Funfas". Sem esquecer um carpinteiro que chegou a trabalhar e pernoitar em Forninhos, Parece que era de Lamego, mas por nos últimos anos viver na Moradia, era conhecido por "Abel da Moradia".
Quem souber mais...
Bem interessante o que nos contou, Paula! Pelo que entendi, eles eram andarilhos e passavam por aí em busca de alguns suprimentos/provisões... Isso temporariamente, né, e eram pessoas confiáveis...
ResponderEliminarGostei de refletir sobre eles, sobre o trabalho oferecido e também dos seus medos...
Um abraço... BOA SEMANA!!!
Bom dia.
ResponderEliminarTambém m lembro de alguns desses nomes, eram pessoas que deambulavam de um lado para o outro sempre na esperança de que alguém os ajudasse a sobreviver.
Abraço
Puxa!!!
ResponderEliminarEm pensar que existem pessoas assim pelo mundo...andarilhos, em busca de vai saber o quê!
bjs
Ritinha
O CEGO E O MOÇO.
ResponderEliminarUm cego andava pedindo esmola pela mão de um moço; a uma porta deram-lhe um naco de pão e um bocado de linguiça. O moço pegou no pão e deu-o ao cego para meter na sacola, e ia comendo a linguiça muito á sorrelfa. O cego, desconfiado, pelo caminho começou a bradar com o moço:
- Ó grande tratante, cheira-me a linguiça! Acolá deram-me linguiça e tu só me entregaste o pão
- Pela minha salvação, que não deram senão pão.
- Mas cheira-me a linguiça, refinado larapio!
E começou a bater com o bordão no moço pancadas de criar bicho. O moço era ladino e disse lá para si que o cego lhas havia de pagar. Quando iam por um campo onde estavam uns sobreiros, o moço embicou o cego para um tronco, e grita-lhe:
- Salta que é rego. O cego vai para saltar embate com os focinhos no sobreiro. Grita ele:
- Ó rapaz do diabo! Que te racho.
Diz-lhe ele:
Pois cheira-lhe o pão linguiça e não lhe cheira o sobreiro a cortiça?
Este conto, que desconheço o seu autor, imortalizou-se, e ainda hoje é analisado nas aulas de literatura.
Eu lembro-me de ainda ver um cego guiado pelo moço, que andava de porta em por pedindo esmola, assim como alguns que passaram por Forninhos e outras aldeias, que aceitavam um naco de pão ou uma malga de caldo, ou até um trapo velho, embora estes também não abundassem, e agradeciam uma palheira para passar a noite hoje ainda vemos muita gente a pedir esmola, só que a esmola que se pede não é um naco de pão, mas sim uma moedinha, que somando muitas dá um bom pé-de-meia.
Os tempos mudaram, ainda há muita miséria, mas a maior está encoberta.
Este tema também é muito interessante, e faz passado não muito longínquo que merece ser recordado.
Na falta de memórias desses tempos, ainda existe quem nos conte contornos dessas lembranças, qual conto de crianças, em que nossos pais nos assustavam por não querermos fazer isto ou aquilo, lá vinha o Toninho das Palhoças ou outro que tal, que nos levava. Claro que sem demérito para os mendigos, que eram respeitados e povoavam o nosso imaginário.
ResponderEliminarAssim vinha a pensar quando hoje apanhei o comboio em Santo Amaro de Oeiras, rumo ao trabalho em Lisboa.
O que vou hoje comentar,um ou outro episódio a que continuo decorrentemente a ir buscar ao regaço da minha mãe?
Assim pensava quando ouço uma voz do quotidiano destas viagens:
- Uma esmolinha pró ceguinho, tenham a bondade de auxiliar, nem que seja a moeda mais pequenina.
Há muito tempo que já nem ligava ao seu apelo, agora solitário, pois costumava andar com a mulher, também cega.
Com este tema, vi-o de outra forma, melhor prestei atenção. Agora vestia bem, andava aprumado e pelos vistos eu distraído acerca da sua mudança, por isso fiquei curioso.
Sai na estação de Algés e não resisto, saio também para lhe dar uma palavrinha.
- Desculpe, há tanto tempo que o vejo por aqui e só hoje reparei que não vem acompanhado, que se passa? indaguei.
- Não se passa nada e perdoe que tenho de apanhar o rápido de Cascais que está quase a chegar e nesse é que vem gente com dinheiro.
- Mas a sua mulher? insisti.
- Morreu vai para um ano e agora é o meu filho que trabalha comigo. Boa tarde.
Fiquei banzado e deixei passar o comboio. Outro viria.
"E agora é o meu filho que trabalha comigo".
Pedir virou profissão e sem descontos...
No Cais do Sodré apanhei o metro para ir para o escritório no Saldanha.
Outro habitué, um jovem romeno com uma criancinha pela mão, tocava concertina no tom " lá vai Lisboa toda ela engalanada", levando no ombro uma miniatura de raça canina com o baldinho ao pescoço para as moedas, enquanto um grupo de japoneses se divertiam, contribuiam e fotografavam o exótico Portugal.
Senti saudade dos nossos queridos "pobres" de Forninhos, tão sinceros e honrados, apenas na busca do sentimento chamado partilha.
E pensei para comigo, enquanto houver pobres de espírito, haverá sempre pobreza!
Tenham uma boa tarde.
Os pedintes pelas aldeias, há décadas, eram comuns por este nosso Portugal. Recordo-me que na minha aldeia, normalmente tinham um "programa" em que passavam duas ou três vezes por ano (talvez para não cansarem quem os auxiliavam ? ). Eram pessoas que jamais faziam mal, ou roubavam, normalmente pouco se sabia das suas origens. Nos dias de hoje, não há mais pedintes lá pela minha aldeia. A partir de certa altura a mendicidade passou a concentrar-se nas cidades, muita dela no anonimato, infelizmente.
ResponderEliminarÉ verdade que os tempos mudaram e agora não se pode confiar em toda a gente que nos pede ajuda, infelizmente. Eu, por exemplo, fico sempre com o pé atrás com esses pedintes dos transportes públicos.
ResponderEliminarMas também porque sabemos que na realidade há situações de grave carência económica e casos de miséria no nosso país, passamos essa responsabilidade para as instituições e deixamos de intervir directamente como se fazia nestes recentes anos.
Será o ideal?
Não sei, porque muitas instituições não o fazem desinteressadamente, mesmo nos meios rurais.
O cuidar, o ajudar quem precisa, não deve ser um negócio.
Boa tarde, não muitos mas eram alguns os que passavam pela minha terra, pedindo esmola, que eram quase sempre os mesmos e por virem de outras terras, muitas vezes o seu nome era agregado ao nome da sua terra natal.
ResponderEliminarNesse tempo a vida era muito dura, quem não conseguia trabalhar era o que lhe restava, pedir, outros por não gostarem de trabalhar acomodavam-se a esta vida, porque trabalho nessa altura não faltava.
hoje como diz o Xico e bem, ser pedinte tornou-se uma profissão, onde muitas vezes quem não contribui ainda é insultado por esses miseráveis, porque os verdadeiros pobres não reclamam nem insultam quem os ajuda, muitos têm este tipo de vida por opção e não porque a vida a isso lhe destinou.
Tens razão, João.
EliminarHoje insultam e quase agridem.
Tempos houve em que se dizia que Portugal devia ser o único país do mundo em que mesmo quando um pobre (verdadeiro), pedia esmola e a não recebia, respondia sempre e na mesma, com um obrigado.
Outros tempos.
Excelente post....
ResponderEliminarCumprimentos
Boa noite Paula, que excelente ideia de falar sobre estes homens (como que em jeito de homenagem), que tal como o senhor da foto percorriam quilómetros e quilómetros e não se sabia de onde vinham nem para onde iam!
ResponderEliminarRecordo-me de ouvir a minha mãe ou a minha avó dizerem: "vem lá o pobrezinho " e lá me davam uma moeda pequenina para lhe oferecer! Recordo-me que agradeciam sempre! Tenho na ideia que eram pessoas com um ar muito triste e calados.Não faziam mal a uma mosca e no temo e que a chave ficava na porta.
Na minha aldeia eram também mais homens que mulheres a pedir esmola! Recordo-me de uma senhora que seria de uma aldeia próxima e que terá sido devorada:((pelos lobos (não tenho a certeza) já eu morava aqui para estes lados!
Realmente no nosso País havia situações como esta e outras das quais sou testemunha e creio que muitas das pessoas de agora nem acreditariam! Beijinhos Paula
De todas as pessoas mencionadas, aquela que marcou muito a minha infância foi o "Volver", de quem eu tinha muito medo. Era uma pessoa esfarrapada, muito suja e carregada de paus.
ResponderEliminarJulgo que foi o "Volver" uma vez na hora da missa entrou de repetente na Igreja carregado de paus assustou todos ao ponto de saírem para o adro.
EliminarPelo que contam ele era um misto: assustador e assustadiço.
Alguém me contou que de facto o "Volver" era muito medroso, vá lá saber-se porquê.
ResponderEliminarUm dia, estava a minha avó Maria da Lameira em casa, quando ouve o barulho de um cajado a bater nos degraus da escada. Era ele a anunciar-se.
A minha avó foi cortar uma fatia de pão e mais qualquer coisita para lhe dar e começou a descer as escadas , mas num repente, o "Volver" desatou a fugir, resmungando como se estivesse possesso.
Por momentos a minha avó ficou incrédula e perplexa, mas depois percebeu, na outra mão trazia a faca com que tinha cortado o pedaço de pão!!
A cabeça dele deve ter-se baralhado e amedrontado, pira-te que se faz tarde...
Ao ler este belo texto, lembrei-me de um conto de Torga com intervenientes como esses.
ResponderEliminarBeijo
De facto um belo conto de Miguel Torga.
ResponderEliminar"Um conto de Natal" que tem como personagem principal o velho Garrinchas que de sacola e bordão por necessidade deambulava de terra em terra a mendigar, tal qual os que passavam por Forninhos.
Obrigado Nina pela lembrança.
Beijo.
Também se conta que uma vez o Abel da Moradia pernoitou no pátio/loja da minha avó Jesus e passou toda a noite a dar Vivas ao tio Maximiano do Afonso, dizendo repetidamente em voz alta:
ResponderEliminar- Viva o Maximiano do Afonso. Viva. É o gaijo mais porreiro do concelho de Aguiar da Beira. Viva!
De manhã, a minha avó, mal dormida e incomodada, por com a sua lenga-lenga não ter deixado ninguém dormir foi ter com ele. Ao que lhe disse: o tio Maximiano do Afonso pagou-lhe um copo de vinho e por isso era o gajo mais porreiro do concelho de Aguiar da Beira!
Tenho uma pequena lembrança do Funfas, de quem me lembro melhor é do Toninho das Palhoças. No dia do batizado da minha irmã Cila, estávamos todos a comer na casa do Mosca e lembro-me de ver o Toninho das Palhoças com um casaco cheio de palhas sentado nas escadas de pedra que a casa tinha, a comer arroz numa malga, nós as crianças não nos chegava-mos ao pé dele com o medo que tínhamos dele, porque os nossos pais punham-nos medo se fazíamos alguma coisa mal feita eles diziam olha que vem lá o Toninho das Palhoças.
ResponderEliminarBoa tarde.
ResponderEliminarInfelizmente nesse tempos os pobres abundavam, não apenas os de fora, pedintes caminhantes, mas também na própria aldeia, que apareciam nas casas um pouco mais abastadas, ou melhor, naquelas em que tinham certeza de receber algo de boa vontade, cautelosamente, quase pela sucapa, afim de não deixarem tornar pública a pobreza.
Dos de fora, deixo um pequeno apontamento que uma octogenária de Forninhos, ontem me contou.
Disse essa senhora, que se lembra dos nomes dos pobres aqui citados, mas que houve uma cena que a marcou até hoje, embora não saiba o nome das personagens.
Andava ela na labuta do cultivo no sítio de Valongo, quando no caminho que também vai dar à aldeia da Matela, ouviu uns gritos de aflição.
Olhou para o caminho com preocupação, na ânsia de saber o que poderia ter acontecido.
A cena erra sem dúvida demasiado real e comovente. Uma senhora já com idade, bastante alquebrada pela vida dura, levava pela arreata uma burra em cima da qual ia um aleijadinho, de pernas curtas e pés pequeninos, apesar da idade já avançada.
O caminho era a subir e a velhota já devia ir cansada, esta pela caminhada e o aleijadinho pela incomodidade do assento e da doença.
A burra não iria melhor, pois a cada passo especava, fazendo finca-pé e aí a "carga" vinha ao chão. Daí os gritos dela, pois já devia ir farta e abespinhada por esta maldição.
Ainda havia que palmilhar caminho até à Matela para obter a almejada esmola e descansar.
Por eles passava um carro de bois e o lavrador cumprimento com o "bom dia", mas ela devia ir tão arrenegada com a vida que nem respondeu à saudação.
E entre o pára e arranca, lá se embrenharam pelos pinhais...
Os pobres da aldeia ou de fora, batiam às portas de quem mais prontamente lhes dava esmola, que não era propriamente a porta dos ricos, mas a porta das pessoas que partilhavam o pouco que tinham. Embora o 'Milagre das Rosas' me venha contradizer. Este conto é um dos mais conhecidos em Portugal e encontrava-se em certos livros escolares de história e conta-nos que a Rainha Isabel, saiu do Castelo do Sabugal (outros dizem que em Coimbra), numa manhã de Inverno para distribuir pães aos mais desfavorecidos. Ao sair, deparou-se com D. Dinis I, que lhe inquiriu onde ia e o que levava no regaço. Tendo a Rainha Isabel respondido: São rosas, Senhor!
ResponderEliminarO Rei D. Dinis I, muito desconfiado, retorquiu: Rosas, em Janeiro?
Quando então a Rainha Isabel, expôs o que levava em seu vestido e ali surgiram rosas, ao invés dos pães que ocultara.
Bonito comentário que demonstra que a atitude e partilha, parte afinal do coração!
EliminarO pãpalimenta o corpo, as rosas o espírito.
Que seria uma coisa sem outra?
Bom final de semana.
Olá,
ResponderEliminargente que belo relato, o que será que tinha na mente destes andarilhos, como os chamamos por aqui. Outro pensava fazer um post sobre esse assunto, aqui tinha o Trindade que morou anos em nossa casa, nunca soubemos de onde veio, hoje penso que ele deve ter cometido algum crime e se refugiava. Realmente não era toda casa que eles chegavam, eles tinha um instinto de onde seriam bem recebidos.
Que bela lembrança nos presenteasse.
Bjos e tenha um ótimo fim de semana.
Boa noite, neste tema com personagens reais a seu tempo, montemos a cena:
ResponderEliminarToninho das Palhoaças, Volver, O Paulo, Luis da Ablosa, Funfas e por fim, a Ana das Courelas.
Todos juntos num palheiro, para os lados da Lameira. Digamos que concentração anual, não de motoqueiros, mas de pobres mendigos. Sem gozo, apenas para desanuviar, pois também eles teriam as suas brincadeiras; lógico.
Em berreiro, todos reclamavam a astúcia pessoal,no modo de pedir, nos feitos alcançados e medos tidos.
Como dirimir uma situação tão sui generis como esta: faltava o júri.
Quem veio?
O regedor da freguesia e o vedor. Um por ser quem era, o outro para decidir quem mais água metia.
Faltava no júri o povo, sim simplesmente a voz do povo forninhense que disse na sua humilde propriedade:
Ó"Toninho da Palhoça"
Com teu casaco de palhas
Ainda vais parar à choça
Cuidado com o que falas
Nem a palha nem os paus
Penses que te vão valer
Não te metas com os maus
Ou a Guarda vai-te deter.
Ó "Volver" repara bem
As crianças reclamam
Tens mais medo que ninguém
Mesmo daqueles que te amam
Assustas e assustado
Já não tens discernimento
Vais ficar sempre encostado
Agarrado a um lamento.
Ó "Paulo", já tão velhinho
Aqui ficas enterrado
faltou um copo de vinho
Ficavas reanimado
Não te vamos condenar
A idade tal não permite
Não nos ponhas a chorar
Antes que a gente grite.
Ó "Luis da Ablosa"
Quem houvera de dizer
Sem trabalho ter comer
Trabalhos não te faltavam
Mas o corpo tal não queria
Faltavam-te as moçoilas
Que na terra por ti choravam
E roubavam-te a alegria.
Ó "Funfas" tu sapateiro
Tão querido na nossa aldeia
Meiguinho que nem cordeiro
Outro não temos na ideia
Na Pardamaia viveste
Foste sempre acarinhado
Um dia desapareceste
Foste viver pra outro lado.
Ó "Ana das Courelas"
O que a gente pode dizer
Pois agora é que são elas
Pensando que já não vinhas
Lá voltavas a aparecer
Vinhas saída do nada
De uma aldeia distante
No inverno tão molhada
No verão tão ofegante.
Assim disse o povo, que pelo carinho que lhes tinham, no seu veredicto disseram que apesar de tudo, seriam sempre bem-vindos.
Comovidos, em uníssono agradeceram:
Forninhos, terra tão linda
O que podemos dizer
Na nossa vida quase finda
Só nos resta agradecer.
Nós que andamos a pedir
Nunca encontramos igual
Um grande bem-haja
Por voltarmos a sorrir.
MUITO BOM!
EliminarCom certeza que eles traziam histórias que viviam ou que davam a viver.
Bjs
ResponderEliminarEu tambem sou do tempo em que todos esses pobres iam a Forninhos.
o Toninho das polhocas para nos era como familia, a minha mae dava-lhe a sopa de feijao com couves e bocados de pao , ia a adega enchia-lhe a rarrafita de vinho que ele sempre trazia com ele de baixo da farrapada, ele quase sempre dormia na nossa palheira na laja da barroca nao faltava manta para se deitar e a palheira estava a disposicao dele sempre que ele quisesse
Obrigada Natália!!!
ResponderEliminarMais uma vez fiquei maravilhada com este belo gesto da avó, de como eram solidárias as pessoas das nossas aldeias, sem anseios de recompensas.
Sublinho "o Toninho das palhoças para nós era como família". Só assim se compreende a sua presença no baptizado da Cila. Havia acolhimento fraterno!
Beijinhos.
Apetecia dizer que me despeço dos pobres, mas infelizmente terá de ser apenas sobre o tema aqui publicado.
ResponderEliminarAqueles aqui retratados, trazem saudades na lembrança, digamos que algum bucolismo, mesmo com chaves nas portas de casa, lojas e adegas, para eles era sagrado, tinham o dono que os auxiliavam, sem necessidade por isso (e porque de tal não tinham índole), de os roubar.
Agora é tudo diferente, cursos intenssivos e práticos na arte de "pedir", melhor, roubar, das mais modernas e sofisticadas formas e variados alvos.
Estão no auge os pobres de espírito, ricos na vaidade e soberba que de tudo se aproveitam, fazendo lembrar aquela ave chamada Cuco que por preguiça e vaidade se aproveita do "ninho" dos outros para aí deixar o ovo! E orgulhosos se mostrarem de peito inchado como se fossem progenitores do que quer que seja.
Desta gente alguma conheço, "melados" insinuantes...
Melhor, proxonetas, pobres de moral e ladrões.
Infelizmente.
Se todos reparássemos, cuidássemos e até denunciássemos tanta "coisa" à nossa volta...o nosso dia a dia e talvez a nossa vida fosse mais "valiosa"...!
ResponderEliminarLembro-me perfeitamente do “Toninho das Palhoças” mais conhecido na Matela por “Toninho de Maceira” ou “BISPO”.
ResponderEliminarO meu padrinho de batismo Daniel Alexandre era um protetor dos pobres, sempre que o Toninho andava pela Matela, comia, bebia e dormia em casa dele. Eu andava na escola primária e gostava muito de História de Portugal, o Toninho era um monárquico convicto e mesmo pobre e esfarrapado era um homem culto, sabia conversar e conhecia a nossa História como ninguém (“pobres” eram aqueles que não o sabiam escutar). Os mais insensíveis tratavam de correr com ele ameaçando-o com a guarda republicana.
O Toninho sofria de ataques epilétricos, tendo eu assistido a alguns episódios, no qual foi socorrido pela bondosa da minha madrinha. Devido à doença sempre que lhe ofereciam roupa nova, ele, ás escondidas tratava logo de a rasgar, sendo a sua imagem de um esfarrapado. Andava sempre provido de comprimidos “Melhoral” e de um frasco com álcool, com o qual desinfetava as mãos, sempre antes de comer.
O seu maior defeito era o gosto pela “pinguita”, adorava vinho, tendo um dia sido encontrado na adega do “Xaxibinha” totalmente bêbedo, deixando a torneira do pipo aberta e o vinho a escorrer pelo chão.
Foi encontrado morto, num casebre na sua terra natal (Maceira), onde se encontra sepultado.
Paz à sua Alma
José Alexandre
Quando eu e o XicoAlmeida resolvemos fazer um post sobre os "ciganos" e depois sobre os "pobres", foi porque achamos que o nosso blog também pode, de vez em quando, homenagear as pessoas que passavam pelas nossas aldeias.
ResponderEliminarIsto de escrever num blog é uma aprendizagem e aos poucos aprende-se muita coisa quando se recebe comentários que acrescentam conhecimento. São as coisas que nós e vocês (que nos lêem) escrevem que muito nos incentiva.
O blog dos forninhenses é pois um instrumento de comunicação para os forninhenses e para todos os que quiserem, que guardam pedacinhos da nossa história e onde se revive aquilo que torna as nossas aldeias beirãs tão especiais.
Bem-haja José Alexandre pela visita e comentário bom! Ainda bem que tomou esta iniciativa.
Um abraço meu,
Paula.
Muito interessante este tema, o qual também já me levou a escrever sobre essas criaturas misteriosas que de vez em quando apareciam a pedir esmola. E, tal como diz, alguns até por ali ficavam a viver em palheiros como um que conheci em miúda e se chamava Pedro.
ResponderEliminarO texto que escrevi era sobre um outro que não me recordo o nome e que poderá ser lido aqui: https://www.facebook.com/permalink.php?story_fbid=1262436720453134&id=294802507216565&substory_index=0&__tn__=K-R