Seguidores

terça-feira, 26 de janeiro de 2016

O povo ainda acredita...

Bem sei que cada vez mais é difícil acreditar em promessas, mas acreditem que nos tempos que correm ainda há promessas feitas, sem qualquer maldade ou segundas intenções. São feitas, silenciosamente, pelo povo crente, que as cumpre perante os santos seus devotos, a quem confiou as sementeiras, os animais e a sua própria saúde....
Lembram-se quando em pleno Verão, no dia da protectora de todos os frutos e sementeiras, Nossa Senhora dos Verdes, ofertavam alqueires de milho e centeio em sinal de agradecimento pela farta colheita? Ou, em pleno Inverno, depois de morto o cevado, a dona da casa ofertar ao Santíssimo uma chouriça avantajada, que seria arrematada no adro da Igreja, num domingo à saída da missa, pelos mordomos?
No intuito de dar continuidade às nossas tradições, religiosas ou pagãs, a Irmandade de Santa Marinha organiza mais um leilão de carnes, enchidos e outros produtos regionais, no Domingo Gordo, dia 07 de Fevereiro, às 15h00, no Largo da Lameira, Paróquia de Forninhos.


Se querem passar um Domingo Gordo diferente vão até Forninhos!

quinta-feira, 21 de janeiro de 2016

Ecos do Largo da Lameira

Era mais um entre muitos, quase ainda nem meninos que, por ali, no largo, íamos cheretear as coisas dos mais velhos nas tardes de domingo. Airoso o Largo, que acomodava almas na sombra da varanda velha, algumas mais do que ela,  colhendo porventura os últimos raios de sol das suas vidas,  résteas...
Aguardavam o que restava de tempos de outrora. Os jogos domingueiros batidos nas malhas  pelos homens, a panelinha, mais pelas mulheres...
Por detrás, na taberna eram batidas as cartas enquanto as mulheres faziam correr o tempo de conversa de regressar a casa e ter a ceia pronta.  


E os gaiatos viam o catrapiscar de olhos para a filha de fulano quando pelas quatro horas se armava o bailarico ao toque do realejo e dia maior, da concertina. Um luxo!
Havia mancebos que iam para a tropa e meias envergonhadas, as moças, soltavam os seus suspiros cantigados...
" O Laurindinha, vem a janela, ver o teu amor, ai, ai que ele vai pra guerra...". Houve quem fosse e não voltasse.
Bastava mais um minuto e orelhas encostadas e estava firmado nas bocas do povo o namoro e casamento.
Ainda hoje nestes bancos de pedra perdura nos mais velhos a saudade vivida ou contada. E contam estórias quando em tal bate a sombra de coisas antigas e actuais, ao ponto de na aldeia lhe chamarem o "tribunal". Gente honesta que aqui ainda vai falando do dia a dia, delas e dos outros. Perderam os locais de convívio, mesmo o mais soberano e enterrado, a Fonte da Lameira que numa pequena aldeia de outrora, triplicava a de hoje. Era uma terra de gentes que no dia santo ou ao domingo, nao aparelhavam o gado, muito menos para carrego, ou na grade ou no arado. Era Dia Santo. Dia de boa comida e pinga que depois da missa e camisa engomada, jantava o melhor que tinha e se ia mostrar na aldeia, na mesma vaidade que ela tinha, com vinte e cinco tostões no bolso, mesmo assim para poupar pois para beber, tal abundava na adega, mas dava para pagar uns  quartilhos de vinho, jogados no jogo da malha, ali mesmo, no Largo da Lameira, mesmo em frente a esta taberna do Augusto Marques que alugava as malhas a troco do consumo...
Ou na taberna do Zé Matela, ao chincalhão ou sueca, ate mesmo a bisca dos nove.
As zaragatas por conta  dos rebanhos que saltando os cancelos por descuido do pastor iam para as hortas e era um fartote de nabos e couves do vizinho.
Mas das estórias,  todas por aqui vinham desembocar.
Mas havia aquelas caladas pelos xailes negros e lenço ao pescoço.
O marido, filho ou genro, tinha partido a "salto" para Franca e derramavam lágrimas num choro apagado que nem o arco da bicicleta que a gente tocava com um arame, acalmava.
Mais atroz na alma das gentes ficaria ao perceberem que tinham partido. E rezavam uns pelos outros..
De cima, dos Valagotes, por causa das neves e dos lobos que dizimavam os rebanhos, uma tragédia, os homens haviam partido, os ribeiros que vinham por ai abaixo e tudo inundando, mais do mesmo, a carrinha do doutor não podia passar depois da Matela.
Por tal "... se este largo fosse meu, eu mandava ladrilhar, com pedrinhas de brilhantes..."
Neste lugar, cada dia cria uma estória.

sábado, 16 de janeiro de 2016

O marrano

" Em Janeiro, um porco ao sol, outro no fumeiro"



Quando alguém precisava emprenhar uma das suas porcas parideiras, pedia a alguém da aldeia que tivesse um porco adulto não capado para alugar. Era um ciclo anual vindo de tantas gerações em que por vezes se fazia mais que meia légua a pé, conduzindo por caminhos escombrosos a porca que estava aluada a partir dos cinco meses e que por sinais da "serventia" inchada tal como as tetas, "pedia que a chegassem" ao marrano. Por vezes, mais que uma ou duas tentativas, pois meio século atrás, em Forninhos poucos tinham porcos de cobrição, tirando e quando tinham, os Matelas e o tio Bartolomeu; tinham de recorrer a aldeias vizinhas como Dornelas, Matela e o lugar do Pontão Vermelho, entre outras...
Depois de emprenhada, o tempo era curto como reza o ditado: "três meses, três semanas, três dias e três horas porcos fora, pois se bem souber contar quatro meses vai achar".
Nascida a ninhada que poderia chegar a dezena, havia que rezar para não vir a moléstia e dar cabo deles, coisa não rara e seria uma desgraça nenhum escapar, pois passadas as quatro semanas havia que os capar.
Muita vez acontecia sem saberem o nome da doença e tal combater; resignada a mulher do lavrador dizia que tinha sido a moléstia, que havia que se fazer. Dava-lhes o mal, ficavam com manchas vermelhas por altura de Abril e por vezes em Setembro, tal como a ninhada, a progenitora também ia para a um valado e coberta de terra, por vezes para gáudio dos ciganos que por ali passavam. Uma desgraça, mesmo, lá se ia a Feira Nova e o rendimento...
Restava remediar o mal e olhar em frente e comprar para criação entre os vizinhos mais chegados ou ao tio Aníbal de Valverde que por ali aparecia na sua camioneta com porcos de boa raça, mas caros.  
O mestre capador da aldeia era o saudoso tio Armando Castanheira, sendo que de vez em quando aparecia um senhor gordo, das bandas de Lamas que se fazia apresentar pelo toque da sua gaita.
A coisa tinha de ser bem feita, pois se o porco ficasse mal capado, a carne aquando abatido, ficava amarga e era uma vergonha ouvir dizer que o animal era roncalho e ninguém lhe pegava. Nem os donos...
Muitas das vezes corriam perigos, tal como um capador que no acto, mal se deu conta de a porca arrombar a porta do cortelho ao ouvir o ganir do filho e de boca aberta e dentes à mostra o correu mais de uma centena de metros. 
Coisas passadas, agora pouco resta de um ou outro cortelho, quanto mais de porcas parideiras e marranos! 
Sobrevive um ou outro roncalho.

Muito já se escreveu n' O Forninhenses sobre a tradicional matação do porco e desmancha, por isso convido os leitores a clicar AQUI, AQUI e AQUI

sábado, 9 de janeiro de 2016

Capelas: Forninhos e Dornelas em 1916

Dornelas é freguesia vizinha de Forninhos. Encontrar escritos sobre estas aldeias não é fácil, aos historiadores não interessavam, pelo que os poucos documentos que chegaram até nós são os provenientes de informações paroquiais e mesmo assim são escassas porque os párocos apenas respondiam ao que os seus superiores questionavam não levando muito a sério a importância das suas respostas para a "sua" terra. 
Vamos analisar a relação das capelas numa e noutra freguesia, pelo olhar do mesmo pároco, José António Tavares de Pina, pároco de Forninhos e Dornelas.
Estamos em 1916, 10 de Dezembro.

1.ª Valagotes. Invocação de St.º António ou de Santo Amaro (?) Estado de conservação bom e paramentos impróprios para celebração de qualquer cerimónia religiosa.
2.ª Da N.ª S.ª dos Verdes. Em bom estado e com paramentos regulares.
Não há mais capelas quer públicas quer particulares não havendo também em qualquer delas relíquias. Ambas estas capelas são públicas.

Nota:
Na memória paroquial de Forninhos, datada de 20 de Junho de 1758, o Cura Baltazar Dias em resposta ao ponto 13.º do inquérito escreveu que: "Tem uma capela de Nossa Senhora dos Verdes fora do povo próximos pertence a mesma igreja, tem mais uma Capela de Santo António esta da quinta dos Valagotes".

Tudo indica que porventura por distracção o pároco não soube distinguir a identidade do Santo (já que o documento mais antigo refere a invocação a Sto. António) ou então o pároco não seria assim tão distraído, podendo ter existido nessa capela uma imagem de Sto. António e outra de Sto. Amaro! É que a imagem do Santo Amaro não tem qualquer parecença com a do Santo António.
-/-
No final, o pároco ainda refere que não há em qualquer das nossas Capelas relíquias, mas...é do conhecimento de muitos forninhenses que no altar da Capela de N. S. dos Verdes, em uma tampa colocada sobre a pedra de ara, foi encontrado em 1984 um papel escrito por D. José Moreira Pinto, que foi Bispo de Viseu a partir de Maio de 1928, datado de 7 de Julho de 1930, com um elogio às relíquias que ele terá visto em visita à nossa ermida.
"die 7 Mensis Julli Ego Josephus da Cruz Moreira Pinto Episcopus Viseensis consecravi altura hoc et reliquias Sanctorum Martyrum grandioso et ... et ... inclusi".
Quando se refere a relíquias, refere-se a relíquias de santos como: pedaços de ossos ou roupa usada por santos?! Ou terá sido um elogio às imagens que ele terá visto na Capela?
O texto de 10 de Dezembro de 1916 fala que não tinha quaisquer relíquias!
Mistérios!

Dornelas tinha (e tem) quatro capelas:

1.ª Colherinhas - invocação de N.ª S.ª das Neves. Bom estado de conservação e com paramentos em relativo estado de conservação, embora já um tanto velhos.
2.ª Capela de St.ª Bárbara. Sem paramentos e em bom estado de conservação. Pública.
3.ª Da St.ª Luzia. Sem paramentos e em bom estado de conservação. Pública.
4.ª De Santo António. Sem paramentos e em bom estado de conservação. Pública.
Não existem mais Capelas nesta freguesia, quer públicos quer particulares, assim como se não veneram em qualquer delas relíquias de santos.

Nota:
Na memória paroquial de Dornelas, datada de 8 de Junho de 1758, o Cura José de Campos em resposta ao ponto 13.º do inquérito escreveu: "Tem esta freguesia quatro capellas, três neste povo, hua de Nosa Senhora do Campo, outra de Santo António ao redor do povo, e outra de Santa Luzia no mesmo povo. Há mais um oratório particular em que se dis misa, que hé de Sebastião Varella de Almeida, cavaleiro do hábito de Cristo, e há outra de Nossa Senhora da Ouvida, que está na Quinta de Colherinhas desta mesma freguesia".

O documento mais antigo menciona que a Capela da quinta de Colherinhas é uma invocação a Nossa Senhora da Ouvida, mas em 1916 o pároco, José António Tavares de Pina, informa que esta Capela é uma invocação a N. S. das Neves; só que nessa Capela sabe-se que existe a imagem de N. S. das Neves e que lá faziam festa religiosa, pelo menos até 1967, com celebração duma missa solene sempre no dia 5 de Agosto (que é o dia de Nossa Senhora das Neves).
Em meados do Séc. XVIII o Cura divulgou a Capela de "Nosa Senhora do Campo", será a Capela de Santa Bárbara?
Em resultado da visita à Capela de St.º António, de Dornelas, o pároco relativamente à invocação do Santo não se interroga (?) o que é de estranhar já que na mesma data, visita duas Capelas com invocação a Santo António e só numa delas (na de Forninhos-Valagotes) coloca a hipótese de a invocação ser a Santo Amaro, pelo que não admira que tenha existido na Capela de St.º António dos Valagotes uma imagem de Santo Amaro, patrono de doenças dos ossos,  comemorado a 15 de Janeiro.

quarta-feira, 6 de janeiro de 2016

Num dia de Reis, meio século passado...


"...E prostrando-se, adoraram-No; e abrindo os seus cofres ofereceram-lhe oiro, incenso e mirra" (Mateus 2,11).

"Quando tinha 19/20 anos, houve na nossa Terra, um dia de Reis Famoso.
À volta de uma viola e guitarra, junta-mo-nos uns sete ou oito: o Sr Pe Matos, eu, o infelizmente já falecido coronel Fernando, e, entre outros, penso que o Luis Carvalho e, numa noite fantástica de gelo e céu estrelado, iniciamos o nosso cantar dos Reis. Começamos na Matela, terra do Pe Matos. Percorremos a rua principal e toda a gente assomou a portas e janelas com uma satisfação e alegria só vistas na época natalícia daquele tempo. E deram-nos pão, queijo, chouriças, etc. Tinham gosto e prazer em ver, ouvir, participar e dar. Era ainda natal. 
Descendo Ademonte abaixo, por aquela estrada de terra e buracos, chegamos à Pontinha, onde preparamos instrumentos e gargantas para a entrada de surpresa em Forninhos.
Quando chegamos ao meio da rua principal, ao pé da famosa oliveirinha, iniciamos o toque e cantar dos Reis. Na velhinha e saudosa árvore dos editais e outros escritos populares, juntou-se-nos a rapaziada da nossa Terra: lembro-me do António Carau, do António Cavaca, do Adriano e do Alfredo, do Samuel e tantos outros que não consigo recordar. Que todos me desculpem se nesta escrita não sou capaz de os lembrar. 
Na Lameira, mais gente entra na trupe. Com aquela melodia suave e única de Boas Festas e letra adaptada a cada pessoa, tão própria deste dia de Reis, entramos em todas as tabernas e casas que, espontaneamente, se abriam naquela franqueza de dar e bem receber, tão tipicamente nossa, da nossa Beira Alta. 
Passava da meia noite, quando atravessamos o terreiro da Fonte e paramos no velhinho balcão de granito da nossa saudosa escola para ganhar fôlego e reafinar a viola e guitarra. A vara de chouriças e morcelas estava carregada... 
Entramos no Lugar, na taberna do Antoninho Bernardo. Grande cantoria cheia de calor e alegria. E copos...muitos copos...Mas com ordem e respeito, próprios de gente de bem e daquela época tão familiar e intimista, carregada do espírito de Natal. 
No auge da festa, entra, porta dentro, a GNR...apreendeu parte das chouriças, identificou vários de nós, intimidando-nos a comparecer no posto de Aguiar da Beira no dia seguinte...O dia seguinte era o início das aulas para alguns de nós... 
Bem como acabou a festa? 
Os enchidos que escaparam foram comidos noite dentro até às tantas da manhã e sempre com a alegria de festa bem regada. Os estudantes que faltaram à apresentação no posto da GNR, por não poderem faltar às aulas no seminário, pagaram a multa devida, e todos os que foram identificados, entre os quais eu, fomos julgados (mas absolvidos) no tribunal de Trancoso, acusados de desacato e perturbação da ordem pública!!...Até o sr Juiz achou graça e um exagero desapropriado na intervenção policial.!!
Quem teria chamado a GNR?...
Será que ainda há alguém que se lembre deste memorável dia de Reis?

Um Ano de 2016 muito bom para todos, com saúde e paz.
Ilidio Guerra Marques"

Tivemos, assim, o privilegio de receber do conterraneo amigo Dr. Ilidio as janeiras neste dia de Reis. Um belo texto sobre um dia de Reis famoso...

sexta-feira, 1 de janeiro de 2016

As Vendas

Sendo ainda altura de festas para todos, mesmo para os comerciantes que fazem na época natalícia mais negócio que noutra altura do ano, não podia deixar passa-lá sem mostrar esta fotografia cedida pelo Dr. Ilídio Marques, um forninhense que nutre um profundo amor pela sua terra e que nos honra com a partilha das suas recordações. 
Penso que a data (JAN-72) é da revelação, tendo em conta o vestuários dos fotografados.


A venda do tio Augusto Marques, era uma das vendas da minha terra. Por ela, foram muitas as gerações que por lá passaram. Neste balcão bebiam um copo e partilhavam as notícias, sobretudo as boas.
Mas mais que tabernas, nestes espaços já meio perdidos nos confins da memória, ou no passar de gerações que as frequentaram, vendiam-se os bens essenciais de mercearia à população; era nas vendas que as pessoas se aviavam e faziam também um telefonema para os familiares que estavam longe e deles recebiam chamadas; nalgumas ia-se buscar o correio e deixava-se o correio; noutras havia argolas  (podem vê-las aquionde os clientes prendiam os seus meios de transporte: burros, mulas, éguas ou cavalos, até é caso para dizer que taberna/venda que se prezasse tinha uma argola!
Para identificar que a venda era também uma taberna pendurava-se à porta um garrafão empalhado e um molho de loureiro para anunciar o bom vinho.

Feliz ano novo para si e bem-haja por comentar as nossas publicações ou só por espreitar por gostar do Blog dos Forninhenses.