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sexta-feira, 18 de outubro de 2013

CONTOS DE FEITICEIRAS


Em tempos recuados a feitiçaria era um assunto normal do quotidiano, crenças e superstições vinculadas às bruxas que, com as suas ervas e rezas, curavam os doentes e aconselhavam aqueles que tivessem dúvidas em algum aspecto de suas vidas. Por tal e por desconfiança, eram perseguidas até ao extremo de arderem na fogueira.
Mas em Forninhos, a crença era diferente, tal como me foi dado perceber por vivências e relatos. Não havia bruxas, simplesmente feiticeiras. Ao soalheiro e nas vendas (tabernas), comentavam quem tinha poderes de feitiçaria, as velhas de xaile e saias compridas quando ficavam encurvadas, o nariz adunco e a dúvida desfeita numa verruga que o mesmo ostentava: tínhamos feiticeira!
As noites de chuva e muito vento eram propícias a este casamento de medos e crendices, como transparece num excerto do livro "Terras do Demo" de Aquilino Ribeiro:
"Sobre as telhas ia grande estreloiçada, chuva, vento, como se andassem por riba delas, rebanhos de cabras ou feiticeiras jogassem para lá com areia às mãos fartas, para tormentina das almas...".
Pelo encanto deste tema que povoou o imaginário da minha meninice e tantos relatos ouvidos na aldeia, não resisti a falar com um "enfeitiçado" há quase meio século atrás: Ti Zé Coelho! O relato que se segue, é como que em modo de entrevista conseguida há quinze dias atrás, curiosamente numa sexta-feira.
Findo o repasto da pós vindima da minha mãe, na qual o Zé Coelho ajudou, combinamos ir tomar a bica ao seu Café e, entre um ou outro cigarro (eu), me contaria a história "delas".
-  Então Zé, como foi?
- Cala-te lá, porra, nem me digas nada, ainda me arrepio. Ó Ana, dá mais um copo (grita ele para a mulher como querendo ganhar coragem).
- Estávamos casados há pouco tempo, eu e a minha Ana, e então "elas" começaram a aparecer umas duas horas depois de me deitar. Noite adentro acordava com elas a rir no telhado, e levavam-me.
Não resisti a uma gargalhada mais que sonora, só de imaginar o amigo Zé montado numa vassoura...
- Ó meu Caraças, ris de quê, verdade, verdadinha, eu morra ceguinho.
- Ok, acredito, e depois?
- Depois acordava na encruzilhada do Carvalho da Cruz, junto a uma fogueira grande, tiravam-me os tamancos feitos pelo tio Bragança e dançavam comigo.
-  Mas dormias de tamancos? Não resisto a perguntar.
- Não, mas sei lá, deviam ser "elas" que os levavam. Depois dançava-mos juntos, agarravam-me todas e atiravam-me ao ar. Riam-se muito, até era engraçado. Quando acordava na cama, estava cansado, acredita pá, cada dia mais, as "gaijas" não me largavam e era quase todas as noites, nem sei como aguentei!
A ti Ana que escutava calada, não se conteve:
- Ó homem, não sabes tu, mas sei eu. Andavas tão cansadinho, amarelo e mal comias e já me tinham dito que deviam ser "elas".
Um dia à noite ouvi barulho e pensei: é agora. Mandei-lhes duas "carvalhadas" que nunca mais voltaram. Tal como os teus tamancos. Ia lá deixar que roubassem o meu homem, ou quê? Toma mais um copo Zé e esquece.
O Ti Zé Coelho anuiu, mas o seu ar, olhos muito abertos, deixaram-no decerto a pensar que podem não acreditar nas feiticeiras, mas que as há, há...

40 comentários:

  1. Muito legal e adorei o conto... Melhor não duvidar,rs E como existem essas falações sobre essas de antigamente,não? Legal te ler! beijos,chica

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    1. Também adorei a peripécia com o tio Zé Coelho. Grande aventura, não é ✿ chica?
      Imaginá-las a atirá-lo ao ar...é demais! :))))))

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  2. Conto uma ocorrida com um "enfeitiçado" há mais de 70 anos: o meu avô Zé Cavaca.
    Um irmão do meu avô, Ilídio, casou em Moreira e emigrou para o Brasil no ano de 1936, e tinha em Moreira um terreno com batatas.
    Foi num dia da arranca das batatas, quando regressava com a carga, vindo de Moreira. O meu avô que conhecia bem o caminho pelos Cuvos, aliás, conhecia muito bem todos os caminhos, mas pasme-se! apareceram uns pássaros muitos grandes que lho taparam e não houve forma de as vacas encontrarem a rodeira!
    Voltou o carro das vacas, para então seguir por outro. Pois sim...aconteceu o mesmo e não havia maneira de seguir. Assim, passou por lá a noite e ao romper da madrugada, espantou-se, já que o carro estava virado para o caminho certo. E, foi só pela manhã que chegou a casa, em Forninhos.
    Contava a minha avó que tinham sido as feiticeiras de Moreira.
    Acreditem se quiserem, mas...que as há...há...!

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    1. Olá Paula.
      Ainda me recordo do teu avô Zé Cavaca, afinal família.
      Já tinha ouvido esta história, mas não tão pormenorizada e real.
      Segundo se ouve contar, parece que "elas" só atormentavam gente de bem, os maus estavam imunes. Será que eram os "zangões"?
      Digo-te mais, cá para mim ainda por cá andam algumas e eu à cautela quando passo por algumas casas ainda faço figas!
      Acautela-te que "elas" andam aí...

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  3. "Que las ha las ha"!!!

    Interessante entrada!

    Um bom fim de semana e um abraco a todos.

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  4. Olá Xico e Paula, ao ler este relato sobre as feiticeiras de antigamente na vossa região, recordei-me também de histórias e mais histórias de lobisomens, de assombramentos e muitas outras contadas nas noites de verão nas soleiras da porta lá na minha aldeia. Eu junto da minha mãe ia ouvindo as amigas e pessoas com mais idade a contar essas histórias como verídicas que me amedrontavam e tiravam o sono. O que era também nunca soube, mas que eram testemunhadas lá isso eram. Até o meu pai tem duas historias passadas com ele;))! Bom fim de semana. Beijinhos Ailime

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    1. Amiga Ailime.
      Mesma que não "as" houvesse, na imaginação eram bem reais. Bruxas, feiticeiras, zangões, lobisomens e mulas sem cabeça.
      Certo é que quando repetidamente as coisas corriam mal, o dedo era por vezes apontado à vizinha, má, invejosa e feiticeira.
      Quem sabe um dia não nos conta aqui as histórias passadas com o sr. seu pai. Adoraríamos!
      Beijos.

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  5. Anónimo10/18/2013

    Hey!
    Estou aqui novamente.
    Eu fiz os testes necessários e os resultados confirmaram a previsão de que mais ou menos sabia.
    Eu tenho alguns meses difíceis para combater esta doença, mas a coisa boa é que é localizada e não generalizada.
    A vida continua e você tem que fazê-lo ir, por isso vou começar esta semana e vai publicar poesiayvivencias desde que me permita minha nova vida, para ver o seu lindo blog e comentar sobre seus grandes pensamentos.
    Obrigado por sempre estar lá! Eu senti suas orações, sua energia, suas expectativas ... Seu amor.
    Você é uma mulher maravilhosa, cheia de ternura e cumplicidade.
    Abraços e beijos.

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  6. OLá Xico,
    rapaz não consegui terminar de ler, me arrepiei de medo, morro de medo dessas histórias, tu está igual meu pai, quando ele começava a contar história de feiticeiras, eu não ficava em lugar escuro e nem sozinha numa casa. Não sei por que tenho tanto medo. hahaha pareço criança. Não acredito em bruxas mas que elas hay, hay(existe). Esse era o ditado de meu pai.
    Te desejo sorte em tua mudança e não esquece de deixar um canto pra mi ai. hahah Rapaz que sonho trocado tivemos, uma vez veio nos visitar um amigo de meu pai e trouxe o filho, ele tinha uma bicicleta, naquele fim de semana trocamos, eu e ele ficamos numa felicidade. Coisas de criança.
    Tenha um maravilhoso fim de semana, que Deus te proteja.

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    1. Olá Anajá.
      Em criança tinha mais medos. Então episódios de feiticeiras contados à noite, na cozinha, meu Deus, cada porta a bater, gato lá fora a miar , chuva a cair e vento a uivar, eram "elas" que por ali andavam, a rondar.
      E toca de enfiar na cama dos pais, de olhos bem abertos a espreitar o escuro ou a frincha da porta.
      Bom fim de semana com poucos medos e arrepios.
      Abraço.

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  7. OI Luap,
    falei pro Xico que morro de me de assombração, nem consegui ler tudo, menina meus cabelos arrepiam e parece que tem alguém atras de mim. Não consigo ver filme e nem ler. Pareço crianças. hahaha
    Bjos e tenha um ótimo fim de semana.

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  8. Vou narrar mais um episódio real passado em Forninhos sobre feiticeiras. Digo real por sempre dele ter ouvido falar e ainda hoje tal me confirmarem. Confesso que estou um pouco arrepiado por ser sexta-feira, choveu todo o dia e no fim de jantar ir à janela e que nevoeiro! Agora voltei a olhar para a rua e as árvores abanam com a ventania e relâmpagos rasgam o céu.
    Será que zanguei as feiticeiras?
    Paciência, arrisco e cá vai:
    Havia um senhor (não divulgo o nome embora na aldeia esteja identificado) que há muitos anos atrás tinha uns terrenos no lugar das Androas e dali as videiras abasteciam de vinho a sua adega. Tinha orgulho na qualidade do tinto que enchia as pipas da adega. No dia em que tirou o vinho do lagar para as mesmas, antes de se deitar, foi como era normal, ver se as vasilhas estavam bem vedadas ou se seria necessário pôr um pedaço de sebo e estopa para tapar alguma fissura. O vinho era precioso, tinha dado muito trabalho.
    Dizem que entrou na adega de candeeiro a petróleo na mão, única iluminação à época e na luz difusa lhe pareceu ver num canto algo a mexer, como que saltitando.
    À pergunta, quem anda aí, quem fôr que fale, nada! Repetiu e o silêncio não lhe deu resposta. Para se precaver pegou numa vara encostada ao canto da adega, junto à dorna e caminhou de candeeiro e vara bem seguros na mão em direcção ao sítio e o que encontrou? Uma galinha agachada em cima de uma pipa.
    Riu-se aliviado, tanto medo para nada, bastava enxotá-la dali para fora e foi o que fez, mas ela não se mexia, parecia ter cola nas patas. Tanto insistiu que perdendo a cabeça lhe deu uma bordoada com a vara, fugindo finalmente a galinha com uma asa derreada.
    Certo, certo é que no dia seguinte, a vizinha apontada como feiticeira, andava de braço ao peito, partido.
    E quando esse senhor lhe perguntou o que tinha acontecido, deitou-lhe uns olhos...

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    1. Esta sim e que e bastante interessante!

      Bem haja amigo Xico e um abraco.

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    2. Ainda bem que gostou, amigo All Cardoso. Fico contente!
      Um abraço para si.

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  9. Paula,

    Eu tive que rir do tio Zé. Rs
    Onde meus país nasceram, no interior do país, existiam muita lendas também.
    Eu morria de medo quando eles contavam essas histórias durante a noite, mas no tempo de criança, o medo ficava esquecido à luz do dia.
    Um lindo final de semana! Beijos

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  10. Uau, Paula e Xico!... Essas histórias são de arrepiar, creio mesmo que elas são mais do que lendas... Gostei do relato e da reação da Ana, "duas carvalhadas que nunca mais voltaram"... Rsss.....

    Bom Fim de Semana... Abraços

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    1. Amiga Anete.
      Penso que aqui se aplica bem o dito: "virou-se o feitiço contra o feiticeiro".
      Um abraço.

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  11. Quando somos crianças os contos de feiticeiras, que todas as aldeias têm, são dos que mais medo nos metem. Em certas noites de ventania, quando se ouvia ao longe o rumor dos pinheirais logo nos diziam que eram as feiticeiras que lá andavam a dançar na sua sala.
    Mas há também as estórias que metem o olhar de pessoas reais. Muitos nossos antepassados, contam-nos, foram vítimas da malfeitoria de mulheres apelidadas de feiticeiras.
    Conta-se que o meu avô Cavaca andava a lavrar na Clementa e um dia vindo de uma propriedade uma mulher, olhou para ele. Tal olhar fez com que um boi se deitasse no rego. Tudo fez para que o animal se levantasse, mas tal só aconteceu quando “ela” desapareceu de vista.
    O facto é real, mas não quer dizer que tal foi devido ao olhar da tal feiticeira. Pode ou não ter sido...

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  12. J SEGURO10/19/2013Olá boa noite, também me ri a bom rir ao ouvir o Zé Coelho a contar as suas a aventuras com as feiticeiras .A minha mulher contou-me agora que em tempos, em Forninhos um homem encontrou uma bela cabra, como não viu ninguém a quem a cabra pudesse pertencer, levou-a para sua casa e fechou-a no curral, no dia seguinte ao abrir a porta do curral estava lá uma mulher.Muitas outras aventuras escutei, lugares que me disseram que estavam assombrados, certo é que muitas vezes passei, por esses lugares a várias horas dá noite e nada acontecia, a não ser uma vez, devia ser perto da meia noite, quando ao passar por desses lugares a campainha dá bicicleta caiu, como era noite escura não havia iluminação, não parei e só voltei no dia seguinte para a ir buscar, nunca acreditei em tais coisas, mas se as há, nunca as vi.

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    1. Pero que las hai, hai...
      Lembrei-me agora ao ler-te que também há outra com uma cabra. Conta-se que um lavrador ao tirar as cabras do curral, notou que uma estava tosquiada "à lapada". Foi uma feiticeira à noite, Com certeza daquelas que gostavam de pregar partidas lol. São, para mim, mais engraçadas que as que lançam o tal olhar...

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  13. O que leva a crer é que alguém inventava uma história para puder encobrir alguma coisa, para que não fossem descobertas outras coisas que não queriam que ninguém soubessem.

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  14. Hahahaha, talvez tenham sido elas a razão do meu bisa ter vindo pro Brasil.
    Abraços

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  15. Essas arrepiantes histórias , vistas à luz atual, são deliciosamente ingénuas.
    Beijo

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    1. Para a nossa geração as feiticeiras são lendárias, mas as pessoas de gerações anteriores, ainda hoje, chegam a garantir a pés juntos que viram feiticeiras, daí que aproveitamos o tema para constar do nosso arquivo como elemento folclórico e etnográfico.
      Bjo*

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  16. Vou contar uma história que se passou com um meu bisavô Coelho pai do meu avô Zé Carau, esse meu bisavô era carpinteiro assim como o foi meu avô e o meu pai. Um dia depois de um longo dia de trabalho de carpinteiro numa aldeia vizinha vinha o meu bisavô já a’ noitinha para casa quando de repente começou aparecer uns coelhos a saltar à sua frente, ele apanhava os coelhos conforme os apanhava eles desapareciam logo das suas mãos como por magia, quando chegou a casa contou o que se tinha passado, como ele gostava de beber a sua pinga não acreditavam nele, mas nesse dia ele pouco tinha bebido e jurava a pés juntos que tinha acontecido, ele dizia que tinham sido as feiticeiras transformadas em coelhos que o estavam a atormentar.
    Não sei se as feiticeiras existem ou não, mas que há coisas sem explicação há.

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    1. Que bom testemunho o teu, Maria, sobre esta temática. Todos são bem-vindos, mas adultos que nós somos, já nem lembramos daquilo que os nossos avós passaram, quanto mais dos nossos bisavós!
      Temos de continuar, cada vez mais, a ocupar-nos da cultura e mentalidade das gentes de Forninhos, para que as novas gerações tenham à sua disposição algumas referências sobre um passado que se extinguiu ou está em vias de se extinguir.
      Se não formos nós a fazê-lo, ninguém o fará por nós!

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  17. Também recordo um dia em que em criança acompanhei um familiar, sentado na traseira do carro das vacas até ao sítio da Ribeira.
    Ia buscar uma carrada de milho para ser escanado. No regresso vinha empoleirado em cima da carga todo satisfeito, quando perto da "Fonte Dum" se escangalhou uma das rodas do carro, saltando fora do eixo. Era impossível, ainda no dia anterior o Ti António Carau lhes tinha feito a inspecção, ele que era mestre em tantas coisas de carpinteiro, então fazer carros de bois, não havia pai para ele...
    Do outro lado do caminho havia uns terrenos que eram cultivados por uma viúva que diziam ser uma "delas" e que na altura andava a recolher abóboras do meio do milho para mais tarde levar.
    Ao olharmos para o terreno estava ela especada, não com um sorriso, mas com esgar como que saboreando a "desgraça" e impropérios do meu familiar.
    Fui chamar o Ti Carau e quando ambos viemos, estava o senhor sentado na beira do caminho, as vacas já presas a um pinheiro. À beira de um ataque, batia furiosamente com o punho da mão direita na palma da mão esquerda gritando: "E foram elas, foram elas, foram elas!"
    Ao que o Ti António Carau respondeu meio divertido: " Ah, e eras tu que não acreditavas".
    Entretanto a viúva já tinha sumido...

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  18. O que durante a infância se viveu numa aldeia ou em qualquer outro lugar nunca mais se esquece, não é Xico?
    Lembras-te ouvir falar de lobisomens (invisíveis) que vinham até à aldeia? É que eu lembrei-me agora que cheguei a ouvir falar dum casal: ela era feiticeira; ele era lobisomem. Era assim mesmo. Era pequena, mas as feiticeiras, lobos e lobisomens, eram imagens que existiam, pelo menos, no nosso imaginário.
    A sensação que tenho é que os lobisomens também não deixavam sossegados os adultos, que para os apanharem, usavam forquilhas.

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    1. Verdade Paula, viveu-se, vivesse e claro nunca se esquece.
      Lobisomens? caramba, desses tenho medo, sim daquele medo apavorado.
      Que vinham pelas matas, atravessando caminhos e muros com apenas um salto e que horror, aquela boca enorme espumando entre dentes, olhos faiscantes e patas com enormes unhas.
      Só pelo medo ao ouvir contar sobre eles, já bastava, existiam.
      Não fora o caso, porque andariam os homens armados de forquilhas à sua espera, quando cansados do trabalho deviam estar já altas noites a descansar?
      Quanto ao casal, ainda conheci e era uma das casas que mais temia ao passar ali à noite, mas sempre a fazer figas e a correr.
      A mulher era a cabra narrada pelo João Seguro no seu comentário acima. A bela cabra que ele descreve, na realidade era um estafermo de mulher, feia todos os dias, tal como o marido, que ainda recordo de carantonha vermelha, poucas falas, talvez para guardar forças para à noite poder ouvir pelos montes.
      Cruzes, Credo!!!

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  19. FEITIÇOS E FEITICEIRAS.
    No tempo da minha meninice era frequente falar-se de feiticeiras e tal como diz o Xico eram apontadas pelo tal uso de saias compridas e rodadas, lenços atados aos queixos, tivessem olhos avermelhados e tortos, nariz cabicancado, esses eram alguns dos sinais para que certas pessoas fossem rotuladas de feiticeiras.
    O que a Paula conta sobre os seus avós paternos, meus pais, também está bem na minha memória, porque foi-me contado muitas vezes.
    O episódio de Moreira para os meus pais, que o viveram, era autêntico e desde esse dia até ao fim das suas vidas sempre o contaram da mesma maneira, porque de facto para eles era real.
    Quero apenas acrescentar que poucos dias passados nessa altura, numa Feira Nova de Penaverde, um amigo de meu pai, de Moreira, lhe perguntou:
    - Ó José Cavaca, naquele dia que andaste em Moreira na tira das batatas, chegaste bem a casa?
    Respondeu o meu pai:
    - Ó Manel Campos, qual cheguei, qual carapuça! Tive que ficar no caminho toda a noite sem dormir, eu, a minha Maria, as vacas e o carro com a carga, porque voavam sobre nós umas passarolas que como que a bater as palmas, sombras e mais sombras, em que aparecia uma fogueira a acender-se e a apagar-se, arbustos constantes cerravam-me o caminho sem alternativa de poder seguir viagem.
    Resposta do Manel Campos, de Moreira:
    - Eu bem disse à minha mulher: não sei se o José Cavaca chegará hoje a casa, porque passaram por ele dois “canhõezões da artilharia” que são famosas e conhecidas pelos seus feitos de feitiçaria e afinal calculei bem, meu amigo!
    E quando dizíamos aos meus pais que se calhar tinham bebido vinho a mais, eles diziam-nos: “nem a mais, nem a menos” e acrescentavam:
    - Ó filhos, nem a cor lhe vimos, quanto mais bebê-lo!
    O meu pai dizia que o que o fazia acreditar era quando amanheceu, o carro estava na rodeira e caminho certo e nada havia a impedi-los de passar, nada de arbustos e nada de à frente haver sinal de qualquer fogueira.
    O povo de Forninhos divide-se em 2 lugares: a Lameira e o Lugar e não é por acaso que no lado do Lugar havia uma rua intitulada “Rua do Lagar” e que também era conhecida por rua das Feiticeiras.
    As pessoas rotuladas de feiticeiras eram sempre de origem e condição pobre, pessoas desfavorecidas da sorte e nunca em nenhumas circunstâncias em condições opostas.
    À classe pobre cabe-lhe toda a desgraça, até a desgraça do fado de serem FEITICEIRAS!

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  20. Bom como disse uma famosa frase,´a mais mistério entre o céu e a terra que imagina nossa filosofia..Abraços.Sandra

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    1. Obrigado Sandra por voltares aqui, sabes o quanto és querida neste espaço.
      Apenas pergunto: Não serão estes "medos" nas crendices, mais um mistério filosófico, afinal uma partícula de um todo que é o ser humano?
      Abraço.

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  21. Gostei da história criativa do seu tio, bruxas que se vão às vassouradas ao invés de voarem nelas. Uma ótima semana para você. Um abraço, Yayá.

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    1. Yayá, aqui na nossa aldeia como em tantas outras deste velho Portugal, a palavra "tio" tem duas interpretações: tio/tia por parentesco familiar, como é comum em todo o mundo, mas o Ti Zé, António ou Manel, é um tratamento de respeito pela pessoa, face a já proveta idade. Também sinal de carinho.
      As montarias em vassouras passaram à história. As feiticeiras modernas agora voam em "veículos" modernos com propulsores a jacto.
      Pelo menos as antigas respeitavam o ambiente...
      Um grande abraço.

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  22. À cautela e para quem acredita em feiticeiras e bruxas, aqui deixo alguns conselhos e curiosidades que retirei do do blog "Bandarra- Bandurra", a fim de evitar males maiores, pois acreditem, "elas" ainda andam aí...
    Aqui a incidência recai mais sobre bruxas, mas como é facilmente deduzível, neste caso concreto na região de Trancoso, aqui tão perto, ambas se confundem nas crenças, medos e mistérios.
    Pela proximidade com Forninhos, porventura que parte disto também se aplicou e aplica na nossa terra. Porque não?

    - A criança que chorar três vezes no ventre da mãe ficará fadada com poderes sobrenaturais e poderá ser adivinho, zangão ou bruxa.

    - Nas encruzilhadas, os cruzeiros e as cruzes afugentam os demónios, as bruxas e as assombrações.

    - Quando se passa por alguém que se julgue com poderes de bruxaria, devem cruzar-se os dedos indicador e médio (figa) .

    - Se chove e faz sol ao mesmo tempo é sinal de que as bruxas estão a pentear-se.

    - As bruxas berram nos telhados como os gatos. Mal pressentem os bebés, correm para eles para os chuparem. Quando assim é, deve-se deitar para o telhado umas pedrinhas de sal, para que elas fiquem entretidas a apanhá-lo. Esta crença surge por julgar-se que aquelas criaturas são obrigadas a contar todos os grãos antes de poderem produzir qualquer malefício.

    - Quando alguém passa descalço por um sítio onde um burro se tenha espojado, deve cuspir para que as bruxas não o incomodem.

    - Depois da meia-noite é perigoso passar por um cruzamento: é lugar de encontro de bruxas e lobisomens.

    - Para que as bruxas e feiticeiras não entrem em casa e na família, faz-se o seguinte: uma mistura de aipos, aniz, pão de trigo ralado e três pedrinhas de sal, tudo metido numa bolsinha que se prende atrás da porta da entrada.

    - Para fazer fugir uma bruxa, cruzam-se os dedos de uma das mãos e diz-se:
    Tu és ferro
    Eu sou aço,
    Tu és o Diabo,
    E eu te embaço.

    - Se uma bruxa estiver na igreja e se se deixar o missal aberto ou se deitar na pia da água benta uma moeda com uma cruz, ela não pode sair de lá.

    - Acredita-se que as bruxas quando deixam os maridos na cama, a dormir, para irem dançar nas eiras e encruzilhadas, responsam-nos assim:
    Eu te benzo meu Belzebu
    Com a fralda do meu cu,
    Enquanto eu não vier,
    Não acordes tu.

    - Para que acabe o feitiço que as bruxas lançam às crianças, que as impede de mamar, fazem-se defumadouros com certas ervas do campo, a que se mistura água benta, sendo então passadas pelo fumo. A cinza restante, coloca--se num caco, numa encruzilhada.

    - Uma bruxa não pode morrer sem entregar os novelos do seu fadário. Daí o ser perigoso pegar nas mãos das ditas quando estão para morrer.

    As bruxas costumam entrar pelas fechaduras das portas e bebem o vinho das adegas.

    - As bruxas costumam montar em burras, com as costas viradas para a cabeça do animal.

    - Se uma bruxa entrar na casa de uma pessoa e esta quiser ter a certeza de que ela o é, esconde uma vassoura atrás da porta, virada ao contrário, ou deita um banco de pernas para o ar. A bruxa não consegue sair.

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  23. Boa Tarde.
    Há 40,50, 60, 70 anos atrás, Forninhos tinha muito mais população, do que tem hoje. Certamente, também tinha mais “feiticeiras”, melhor, pegando nas palavras da minha tia Margarida, tinha mais gente humilde, pobre, pessoas desfavorecidas da sorte, a exemplo do resto do país rural, em que a agricultura era a sua principal ocupação.
    No Forninhos rural, também se dizia que a criança que chorar no ventre da mãe poderá ser adivinha ou até bruxa. Acredita-se que em Forninhos nasceram crianças que “falaram” no ventre da mãe e hoje adultas, andem mesmo por aí…Xico.
    Para evitar males maiores, descreves “Nas encruzilhadas, os cruzeiros e as cruzes afugentam os demónios, as bruxas e as assombrações”. Forninhos tem alguns cruzeiros em encruzilhadas, por exemplo, tem um muito próximo da encruzilhada, onde uma estória de feiticeiras teve lugar há cerca de 50 anos. Uma estória que aqui foi revelada…que idade terá o Cruzeiro do Carvalho da Cruz? Cinquenta ou mais anos...?
    E...quantas estórias semelhantes aconteceram e ficam por contar...?

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  24. É um facto, tinha mais gente e boa, claro que mais "feiticeiras" também, mas na proporção hoje haverá mais e mais zangões, uns nascidos, outros vindos.
    Havia que partilhar conhecimentos... e Forninhos tinha cenário para as "práticas".
    Era e é uma montra aberta ao mundo de certas pessoas falsas, meladas e exibicionistas.Mas adiante.
    Curiosamente o Carvalho da Cruz, está no mesmo patamar que S. Pedro, não obstante por referências diferentes. Na serra, o santuário de história, lendas e mistérios, já aqui sobejamente narrados. No Carvalho da Cruz, sempre o ouvi referenciar como o santuário de feitiçaria, não passassem por ali a maioria de episódios acerca "delas" e ainda para "ajudar", havia que passar frente ao cemitério, não muito distante.
    Se o cruzeiro na altura as afuguentava e as vassouras não aterravam, agora voam em carros de alta cilindrada, ficando esperançado o cruzeiro que num despiste "alguma" ali se vá aninhar.
    E se muitas ficam por contar, talvez seja por alguns ou algumas não gostem de falar de si próprios Ahahahah....

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  25. O Carvalho da Cruz era mesmo o local predilecto das feiticeiras e ali devem ter acontecido muitos mais episódios. Até se dizia que "elas" tinham lá um berço com um bébé que embalavam. O bébé, dizia o povo, era o corpo do diabo. Chegada a meia-noite davam-lhe um sopro e Pum! Pum! Pum!

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  26. Sorte teve o Zé Coelho em já não caber num berço, senão a esta hora ainda o andavam a embalar, assanhadas que andavam com ele. Do mal o menos, dançou, viajou no ar e pelo menos não ficou com o diabo no corpo.
    Acho eu...

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  27. Não só das cabras mal tosquiadas mas também das ovelhas se ouvia falar, uns culpando as feiticeiras, outros que era obra do diabo. Certo é que muita gente as viu "retalhadas", jurando os pastores a pés juntos que lhes não haviam tocado, pois por vezes ainda não ser altura da tosquia e mesmo que fosse perdiam o dinheiro da lã.
    Ou seria que era para "elas" se aquecerem nas noites mais frias no Carvalho da Cruz?

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