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sábado, 1 de outubro de 2016

Coisas da Escola

Não havia mesas ou secretárias, havia as carteiras em madeira com tampo inclinado e o quadro da escola, à frente, enorme, que era quase sempre fonte de conflito: quem ia ao quadro era de castigo e a seguir o castigo ainda era pior, para alguns...
O alfabeto era o meu preferido.
Nós líamos o alfabeto assim:
- A, Bê, Quê, Dê, É, Fê, Guê, Agá, I, Jê, Lê, etc...
Hoje é como vocês sabem.
Ora, este modo de ler os nomes das letras levavam a que houvesse sempre confusão com duas letras cujo nome era lido da mesma maneira, por exemplo: o 'c' e o 'q'. Ou seja, com leitura da época os dois eram 'quê'. Então o 'c' era quê e aquele que fica lá para a frente no abecedário, depois do 'pê' era o 'q' de 'qua qua'.
Mas havia uma fórmula muito mais antiga de o chamar: era o 'quê de 9'. Se não acreditam basta perguntarem aos pais ou avós, consoante a idade que tenham...ou aceder aqui.
Se reparar esse quê e o 9 são iguais no desenho. A posição relativamente à linha de escrita é que é diferente: o quê assenta a barriga na linha, ao passo que o nove assenta na linha a pontinha da 'haste'.  
Essa linha, era sagrada. A barriga de cada letra tinha de assentar nela.
Devem lembrar-se que para os principiantes até havia cadernos de duas linhas, ou seja, cada 'linha' de escrita eram afinal duas linhas e era dentro delas que se escrevia: nem para cima, nem para baixo, à excepção, claro, da haste do quê para baixo, a do 'dê' para cima, a do 'pê' para baixo, o 'h' que ultrapassava a de cima, etc...
E a tabuada? 
O meu livrinho da tabuada

Não havia calculadoras, nem computador para fazer contas, felizmente aprendemos a fazer contas nós mesmos!
 As contas eram feitas na cabeça de cada um (eu às vezes contava pelos dedos, confesso).
Tardes inteiras, em grupo, a decorar e cantarolar: 
- 2 vez 1, dois.
- 2 vezes 2, quatro.
- 2 vezes três, seis...e por aí adiante...
Acho que a cantilena era a mesma por todo o país, com a mesma entoação.
Letra e música feitas nas escolas do então Magistério Primário do nosso país, pelos vistos!
Não há como não lembrar também o livro de leitura de cada classe e o material que não era propriamente de ensino, como a régua -não a régua de régua e esquadro-, mas das reguadas e a vara de carvalho ou cana da índia ou fosse lá do que fosse - eram estes os materiais muito em voga nas mãos dos professores da época. 
E, finalmente, mas não menos importante, os mapas, o globo terrestre, alfabetos em madeira, unidades e instrumentos de medida.

Notas:
- Não são do meu tempo: o aparo e a caneta do tempo e o tinteiro na carteira; a pedra de ardósia e a pena (julgo que também de ardósia, o giz veio muito mais tarde) com que se escrevia nela, a palmatória e as fotos de Salazar e Tomás.
- Li sobre o 'quê de 9' num blog chamado "capeia arraiana", a cujo autor agradeço, e foi por aí que nasceu este artigo.

23 comentários:

  1. Adorei ler o teu post.Aprendi assim e aproveitei muito do modo como me ensinaram para adaptar quando leccionei.

    BEIJINHOS.

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    1. E os ex-alunos da Elisa vão sempre lembrar-se de si, porque os/as professor(as) das primárias, são um dos quatro pontos cardeais das nossas vidas.
      Eu lembro-me muito bem dos meus professores da primária: a professora Lurdes e o professor Rocha. Ensinaram umas três ou quatro gerações...em Forninhos.
      Beijinhos.

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  2. Que lindo e nostálgico post.belas recordações.Adorei recordar as carteiras e as tabuadas cantadas. Lindo! beijos, ótimo fds! chica

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    1. As sessões de grupo a cantarolar a tabuada eram o máximo!
      Eu ainda tenho a tabuada com o meu nome, com uma letrinha daquelas do caderno de duas linhas (o nosso livrinho da tabuada tinha uma linha para o aluno escrever o seu nome), mas como está em Forninhos só por isso não a pude aqui publicar. Lá para a frente ainda a vou inserir.
      Bom fim-de-semana,
      Beijinhos.

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    2. Nota: Acabei de inserir a tabuada graças à colaboração dos residentes.

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  3. Fui professora e através desta página...recuei no tempo e sorri!
    Bj

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    1. Estas coisas despertam mesmo memórias sobre antigos alunos e professores.
      As Escolas Primárias que fecharam deviam tornar-se num Espaço Museológico afim de proteger objectos e avivar memórias, mas tudo isto é chorar sobre o leite derramado...
      Bjos.

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    2. Concordo e aproveitar os edifícios para esses projetos...melhor ainda! Bj

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  4. Oi Paula... Quantas lembranças!
    Um tempo valioso, mas as exigências eram muitas... Tabuada, letras 'desenhadas', pronúncias... Hum, pequenininhos já aprendíamos muitas coisas... Hoje, vejo doutores sem saber o 'Bê-A-Bá', a tecnologia c os seus mistérios...
    Das férias, c carinho e um abração...

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    1. E além da escola ainda havia a catequese, em que tínhamos de aprender os sacramentos, os mandamentos de Deus e da Igreja, coisas da bíblia...
      Boas férias.
      Um abraço.

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    2. .....

      E o " terço " que minha avó Maria nos " obrigava " a
      rezar todos os dias....

      Da "Primária "recordo-me das reguadas/castigos,cada
      erro no ditado uma reguada, se falassemos muito meia
      hora de pé no banco ...
      Eu levava em média duas reguadas por dias ,dois erros
      mas tinha um colega deficiente motor , filho de um dos homens mais ricos do sitio, que tinha sempre 30/
      40 erros no ditado ...( imaginem !!!! )

      Aos 51 anos ainda me recordo do massacre ao inicio de cada tarde ( a D Noémia corrigia o ditado ao almoço),
      o - Paulo - tinha muita força e com o braço direito impedia o impacto da régua grossa na mão esquerda !
      Era uma luta....
      Não vos conto a vida desse rapaz mais tarde ..!!
      Salazar e Jesus Cristo na parede a assistirem....

      ....Nos anos nos 90 ( 96/2000) no pátio da Escola de Forninhos joguei á bola com os meus filhos ..( deles
      já vocês sabem da história ..)

      Abr
      MG

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    3. Hoje, quando por ali passo, o que mais me entristece é ver o mau estado de conservação do imóvel, é ver os recreios abandonados.
      A escola mesmo não sendo lugar de estudo e brincadeiras, porque encerrou portas devia ser um lugar de memória, como já acima disse.
      Passaram 10 anos sobre o encerramento e, francamente, não sei o que pretendem fazer com o edifício, mas era bom que a Junta de Forninhos o adquirisse à Câmara de Agb e ao menos o conservasse não alterando as fachadas e a área circundante!
      Com a venda dos baldios, nos Valagotes, a Junta ficou com os cofres cheios, podia muito bem adquiri-lo. Eu sinto uma imensa pena quando ouço os autarcas dizer que a escola não é 'nossa', mas da Câmara e que é à Câmara que compete a sua conservação.
      Resta-me ao menos a consolação de estar situada em Forninhos.
      Bom domingo.
      Abraço.

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  5. Eu sou do tempo do quê de nove. E da "menina dos cinco olhos" que a professora Georgina ( chamávamos-lhe Georgina Gata)usava com regularidade. Ficávamos com as mãos quase em sangue, e nenhum pai ia ralhar com a professora, por causa disso. A minha mãe, deixou-me na escola com estas palavras.
    "Aqui lha deixo. Se ela precisar chegue-lhe a roupa ao pêlo. Desde que não lhe quebre nenhum osso, só se perdem as que caem no chão." E não pense que foi só a minha mãe. As mães das restantes crianças alinhavam todas pelo mesmo time.
    Um abraço e bom fim de semana

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    1. Como os tempos mudaram, não é Elvira?!
      Havia excepções, claro, mas quase todos os professores afirmavam-se sobre os seus alunos através da violência e se algum fosse queixar-se aos pais ainda levava mais em casa e talvez com mais força!
      Eu apenas conheci a vulgar régua (ainda levei uma reguada) mas de tanto ouvir falar da palmatória ou "menina dos cinco olhos", ela fazia parte do meu imaginário.
      Bom fs/Abraço.

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    2. A minha professora da 1.ª e 2.ª classes era exigente na sala, nos ditados e tabuada usava a régua, cada erro cada reguada, mas acho que com ela só não aprendia quem não queria! Era uma pessoa que gostava de tudo limpo e tinha muito carinho pela horta, árvores e jardim da escola.
      O seu marido, professor da 3.ª e 4.ª classes, pouco usava a régua, mas chegou a usá-la, algumas vezes nas mãos dos seus filhos. Apreciava os bons alunos e ajudava muito os alunos médios.
      Não me canso de elogiá-los.

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  6. Eu não tenho saudades nenhumas do tempo em que andava na primária...


    Isabel Sá
    Brilhos da Moda

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    1. Eu até gosto de recordar o tempo em que andava na primária. Das duas, uma, ou são saudades ou estou a ficar velha. Fico-me pela primeira ;-)
      Boa semana.

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  7. Fiz uma viagem ao passado com este belo texto em que eu vivi estas situações e quando fui para a Escola Comercial antigo 3º ano usei os aparos e tinteiros na disciplina de caligrafia, outros tempos.
    Um abraço e bom semana.
    Andarilhar

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    1. Obrigada Francisco. Acho que só faltou a referência à sacola de serapilheira e à bata branca. Na altura em que eu andei na primária era obrigatório todas as crianças usarem bata branca.
      Bom fim de semana também.
      Abraço.

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  8. Boa tarde Paula,
    Que "post" tão interessante!
    Apesar da nossa diferença de idades estudei também nesse Livro tão especial que me abriu os olhos para a leitura e escrita. A tabuada era igual e também a cantei no pátio da escola com as minhas colegas nos intervalos. O tempo era todo aproveitadinho. Na época as professoras tinham turmas de quarenta alunos (na minha aldeia) com os quatro primeiros anos e tinham que disciplinar tudo muito bem. (Claro, rapazes e raparigas em salas diferentes, não fosse haver contágio...;))!A cantilena ainda hoje a retenho na memória. O meu filho mais novo já aprendeu com o auxílio duma máquina de calcular muito simples, mas por outro lado tinham uma forma mais interessante de aprender os algarismos e contas já como uma espécie de iniciação à matemática. No entanto, ate "arregalei" os olhos na altura;) quando pediram a máquina.
    Gostei de lembrar o q nove e o c de cão;))! Os meus filhos é que já são da era do qua qua;))!
    Foi muito bom reviver os meus tempos da primária. Adorava aprender e estudar. Agora estou mais preguiçosa. Já se passaram muitos anos...
    Beijinhos e óptimo feriado.
    Ailime

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    1. Falando em salas diferentes, sei que Forninhos também teve a escola feminina e a escola masculina!
      Quanto a métodos, de lá para cá foram sendo modificados e ainda assim o nosso país tem um grande número de analfabetos (há cerca de meio milhão de analfabetos em Portugal, segundo dados do Instituto Nacional de Estatística (INE), baseados no Censos de 2011)!
      A maioria é idosa e vive em zonas do interior, mas existem uns 30 mil que ainda estão em idade activa, ou seja, com idades compreendidas entre os 18 e os 65 anos.
      Inacreditável.
      Beijinhos e obrigada por mais um excelente comentário.

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  9. Coisas da escola...
    Infelizmente não temos em Forninhos, recordações físicas guardadas de meados do século passado, a não ser as estruturas da escola das raparigas em cima e a dos garotos em baixo ao abandono, fechadas, mas que poderiam guardar e mostrar como eram as coisas para como se aprendia a ler, a escrever e contar, antes com tempo, depois por obrigação.
    Recordo o meu "andar à escola" e porventura a coisa mais "atroz" e feliz da minha vida. A gente, pequenitos íamos a dormir de sacola de pano nas costas, uns descalços, outros mal calçados, esperando o tempo "dessa" coisa acabar para irem ajudar os pais nos campos, e depois desapareciam dias seguidos.
    Recordo uma senhora professora de uma aldeia chamada Mata, a melhor para mim, recordo, claro, as mesas de dois lugares com os buracos para os tinteiros e as canetas de aparo que do uso abriam e esparramavam a tinta barata que o mata-borrão nao secava. As réguadas dos outros que mal dormidos que respondiam que dois vezes três ou três vezes dois, respondiam que não podiam saber tudo.
    Recordo ao entrar na sala, anestesiados, o cumprimento ao ti Américo (Tomaz) e ao ventriloquo Salazar, pai ainda adorado por muitos descententes de saudosistas que pediam de porta em porta, em Forninhos e hoje destilam venenos a quem os ajudou a estarem vivos.
    Enfim, quando ainda hoje temos como "Sua Santidade" uma simples professora primária (não confundir a nobre e honrada classe), que gere quase em absoluto os destinos de um povo, será que saberia responder ao teorema de Pitágoras?
    Em terra de cegos, agora é-se rainha!
    Adiante e voltando a coisas boas deste lindo, antigo e actual post e como o comentário vai longo...
    O exame da quarta classe. Coisa marcante. (Devia ter posto ponto e vírgula senhora professora, mas um ponto tem outro ênfase, não acha?).
    A festa verdadeira do fim da escola, era este exame, fatos novos e canetas de tinta permanente para o exame em Aguiar, coisa medonha com aqueles quadros de coisas de África, linhas de comboios, tanta coisa mas o ditado...
    Para acabar, termino com um episódio caricato. Fiquei na fila da frente para o exame e a minha professora pediu-me que quando ditassem palavras com "Ç" de cão, eu puxasse a minha orelha e assim não se enganarem com "s". Batota carinhosa da minha professora, os pais queriam os filhos despachados, pois então, havia tanto trabalho a esperar e já dali vinham letrados!
    Acabava na aldeia com foguetes de vinte e cinco tostões comprados nos ti Augusto.
    Desculpa, mas ficava aqui a noite inteira, caramba!

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    1. Tudo próprio de uma terra de oportunistas, que em proveito próprio se aproveitam de tudo e de todos; basta para tanto ver o que se passou em Julho passado, em que numa representação de aula já foram buscar as carteiras que há anos estavam (e devem continuar a estar) amontoadas e a degradar-se no barracão do Picão!
      Também ficava aqui a noite inteira a esclarecer os que estão longe do que se passa, mas não vale a pena...antes recordo o meu primeiro dia de escola. Tinha uma bata branca com as minhas iniciais 'PM' (Paula Maria) bordadas a azul. Lembro-me muito bem da carteira em madeira com uma ranhura para os lápis e a professora já tinha uns papelinhos com o nome de cada aluno, que cada um afixou/colou na carteira para depois à medida que íamos aprendendo as letras, principiando pelas vogais e partindo depois para as consoantes, podermos fazer o nosso nome completo e... por momentos estive naquela naquela sala de aula!

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