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sexta-feira, 11 de abril de 2014

O Cuco e a Poupa

"Se entre Março e Abril o cuco não voltar, ou ele está morto ou o mundo vai acabar". É, portanto, por esta altura do ano que ele vem e se ouve na nossa aldeia o tradicional desafio ao cuco:
- cuco, cuco ramalheiro, quantos anos estou solteiro?
- cucu, cucu, cucu...responde no seu cantarolar. E cada canto corresponde a um prolongar desesperado de mais um ano sem casar...

O cuco
É malandro e preguiçoso, ocupa o ninho dos outros deixando os ovos como se fosse em sua casa e que lhe criem os filhos que ele tem mais que fazer, apanhar sol e cantar como antes os seus pais fizeram e como os seus filhotes no ano seguinte farão, mas as pessoas gostam dele por estar associado à Primavera. Vem de longe, do norte de África, todos os anos, fazer com que as pessoas passem a notícia da sua chegada: "já ouvi o cuco e  já me espolinhei no chão...".
E a primeira vez do ano para quem o ouve cantar, é uma alegria enorme, o Inverno já se fora...! 

Poupa
Haverá ave mais linda e, ao mesmo tempo, mal cheirosa que a poupa? 
As pessoas ficam rendidas à sua beleza única e ela altiva sabe que o ninho das suas crias está mais bem guardado que qualquer outro pelo mau cheiro que este transmite, afinal a sua e dos seus, defesa natural.
Orgulhosa, abre em esplendor a sua crista soberba e canta "pou...pou...pou" como que apelando à poupança e é curioso que as pessoas percebem a mensagem já que quando se ouve a poupa dizem "lá vem a poupa a avisar que poupem, poupem, poupem...".
Vem até Forninhos quase pela altura do cuco, mas mais estival, quase antevendo o cheiro das searas...
No tempo em que o calor começa a apertar com os agricultores na labuta diária dos campos, só encontro paralelo em tanta cor e graciosidade com os gaios tagarelas, arribados para os lados de Valongo e Carregais, nas sombras dos arvoredos.
Que estas belezas ainda reais, nunca se esqueçam das nossas aldeias rurais, afinal são parte delas.

23 comentários:

  1. O que dizer? Simplesmente encantador tudo isso por aqui! ADOREI ver os ditos e tradições daí! muito legal! abração,chica

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    1. Pois é Chica, ditos que a sabedoria popular manteve, ou uns poucos teimam em dar continuidade, honrando a tradição.
      A sabedoria dos "velhos" tem outro encanto...
      Abraço.

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  2. Oi Xico,
    o cuco e a poupa são pássaros que não conheço, achei muito lindos, principalmente a poupa, pena que tenha mal cheiro, mas a natureza é sabia, e se é pra sua defesa, ótimo.
    Gosto muito de saber dessas curiosidades que você tão bem sabe contar.
    Beijos!

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    1. Se são lindos, Fátima!
      Então quando vistos e ouvidos nos primeiros dias quentes, no seu habitat, ali perto junto à mata e encostados ou deitamos junto à beira de um ribeiro, cada vez mais vai parecendo que o milagre voltou a acontecer.
      Afinal o mundo ainda está vivo, apesar de zangado com as gente que não o respeitam.
      Beijinho para si.

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  3. Engraçado esse tradicional desafio ao cuco. Será que pelo menos acerta algumas vezes?...:-)
    Nunca tinha ouvido a palavra espolinhar, também nem suspeitava que a poupa cheirasse mal, o que neste caso lhe dá um grande jeito para afastar
    indesejáveis. E bonita como é, quem é que se importa que cheire mal?
    Que estas aves voltem sempre, por elas, e por nós.
    Sinto um grande fascínio por aves, até lhes fiz um poema. Este:

    ESVOAÇAR

    Uma rola rola, rebola no restolho

    Árvores estáticas sobrevoadas por pardais
    e pombos. No calor tórrido, ouço uma cotovia
    cruzar-se com negro melro nos azinhais.
    Nem sombra de vivalma de noite ou de dia,
    apenas uma agreste e estranha calma
    que ora se mascara de paz, ora de agonia
    de antigos sobreiros que no calor sangram
    inconscientemente sua forte e leve cortiça.
    Vinda de longe surge no ar uma carriça,
    um tordo, uma felosa surgem no caminho
    de terra dormente, não de sono ou de preguiça.
    O picanço, o pintassilgo e o estorninho
    aconchegam com enlevo as crias no ninho.
    Maçãs vermelhas caem de maduras no pomar,
    e cigarras soltam do ventre, ardente canto,
    convite estridente para a fêmea. Surge a voar
    um rouxinol, recorta no espaço, sem espanto
    bailado breve, divina melodia. Rasa o chão
    enquanto nos ares se anuncia um gavião.
    Há no silêncio das casas corpos que se abraçam
    em crepitante colchão de secas folhas de milho,
    raros fios de água no regato seco se entrelaçam
    e logo se evaporam ao sol, como rastilho.
    Sob o olival milenar descanso. Sou feliz.
    Rasgam os campos uma águia e um açor,
    atemorizam a galinha-de-água e a perdiz.
    Mais nada existe que o sossego deste calor
    de guarda-rios, abetardas e cegonhas.
    Uma calhandra, um milhafre e um chapim
    invadem o meu sonho, trazem com eles
    bufos e garças, sentam-se perto de mim.
    Nesta aparência de sufocantes horas mortas,
    sapos coaxarão ao anoitecer perto das hortas
    e o tempo que finge passar tão devagar
    escreverá a direito por linhas tortas.
    Liberto os olhos na distância, vejo lavrar
    no horizonte, o voo daquela pega-azul...
    As papoilas morreram...Evito dizer adeus
    Levo comigo a graciosidade das aves do sul
    e a beleza eterna da cor de todos os céus.

    Desculpem-me o atrevimento...:-)
    xx

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    1. Laura: Parabéns e obrigada pelo poema! É lindo e vou ter de o ler à noite devagarinho, pois estas coisas para mim têm um sabor especial que não se coaduna com pressas e stress.
      Esclarecendo. A palavra espolinhar é sinónimo de espojar = fazer rolar no chão.
      Em Forninhos quando se ouvia o cuco dizia-se que dali para a frente tudo medrava e então havia o hábito das crianças se espolinharem no chão quando ouviam o cucu-cucu do cuco ramalheiro anunciando um bom prelúdio para os dias que se seguiam.

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    2. Olá Laura, palavras que esvoaçam em memórias, desde o milhafre ao chapim e aquelas garças boieiras, pacientes junto aos regolfos do rio enquanto a terra era mexida e se preparava a eira...
      Poderá este post, visto de ângulo diferente, ser uma caricatura da sociedade actual, vestindo cada personagem a seu modo, qual extrapolar da fábula da formiga e da cigarra.
      " O cuco e a poupa
      Fizeram uma patuscada
      Mas o cuco comeu tudo
      A poupa ficou sem nada".
      Os termos, são das nossas gentes, vividos inocentes e sérios no bom ou mau presságio, conforme o acreditar.
      Agora é difícil dizer o que vai na alma, a Senhora brindou-nos neste espaço com uma coisa rara, a magia da sua poesia, sentimentos e carregadora de um mundo que quer manter vivo e partilhado.
      Sem delongas: Bem-haja Laura, pela honra concedida com tal riqueza!
      Um abraço.

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    3. Obrigada pela explicação, Paula, mas eu mal vi a palavra fui logo em busca do significado que, claro , calculei que fosse esse....:-)
      Ah, Xico, deixe lá a "Senhora" fora disto!...Faz-me lembrar a Nossa Senhora de Fátima, com todo o respeito!...:-)
      Sim, acho que os blogues deveriam servir mais para transmitir conhecimento e partilha de ideias, porque se não o forem não terão grande utilidade.
      Quanto ao cuco e à poupa, haverá sempre quem coma tudo e não deixe nada para os outros, e as nossas gentes sabem isso muito bem, porque o sentiram e continuam a sentir na pele. Algo que nos remete para "Os Vampiros " do Zeca.
      Obrigada, Xico e Paula. Bem hajam ambos por valorizarem o que tem importância. A partilha de conhecimentos e experiências de vida. É por isso que aqui venho....:-)
      xx

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  4. Xico, o Cuco e a Poupa são pássaros tão lindos! Foi bom conhecer características e detalhes dessas aves...
    Um Bom Fim de Semana p você e a Paula...
    Abraços

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    1. Lindos são, Anete!
      Mas tão diferentes, o mandrião e a poupada, mas no encanto da aldeia, quando tardam, é uma tristeza e apoquentação: "afinal o que se passa...".
      Abraço grande.

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  5. Maravilhosas beijo Lisette.

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    1. Tenho a certeza que nos iremos falar muitas vezes.
      Obrigado e bem-haja.

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  6. Eu gosto muito de ouvir o cuco e também acho que é por anunciar um tempo ameno e de medrança que as pessoas do campo gostam tanto dele e lhe toleram o seu parasitismo no que se refere à reprodução.
    Do som da poupa não me lembro muito bem, deve ter um cantar pobre em termos melódicos, mas sei que quando as pessoas ouviam o pou-pou-pou diziam: "lá vem ela com o aviso de poupança". É óptimo que volte sempre, com a sua beleza, mau odor (que em defesa das crias têm) e aviso de poupança, mas será que daqui para a frente ainda haverá algo para poupar?

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    1. É o encanto do cuco, toda a gente gosta de o ouvir, poucos o vêem por o malandro andar escondido na mata por vergonha em se mostrar o "calinas".
      Come e canta, os filhos estão entregues e vai dando "música" aos desesperados que anseiam por o ouvir, como manda a tradição, sob pena de o ano ser mais triste.
      Já a poupa tem a sorte invertida, linda que nem uma rainha, solta avisos ali e acolá, despertando consciências, mas as pessoas não ligam, afinal cheira mal. mas tem razão, na ida às compras, é o seu nome que reina: Poupa! Poupa...

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  7. Se há coisas de que tenho memória da minha meninice lá na aldeia, o Cuco é uma delas. O seu canto é inconfundível, mas também por estar aliado à Primavera, depois de Invernos difíceis e o auguro de dias mais agradáveis. Quanto à Poupa, bem me lembro, mas digamos, não me marcou tanto como o Cuco.
    Boa ideia, Xico, ao trazer-nos estas memórias..
    Abraço,
    Manuel Tomaz

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    1. Amigo Manuel Tomaz
      Tantas coisas se contam ligadas ao cuco, a quem chamo de malandro, aliás, "o bom malandro" por todos acarinhado.
      Transformado num deus do nada fazer, acha que tem razão e goza: "só canto quando me apetecer, bem podeis esperar e se calhar nem casar...".
      Tal como estará a dizer à poupa que por ser mal-cheirosa, exibe a sua beleza tentando arranjar namorado.
      Mas esta, põe em primeiro lugar os filhos, em contrário ao outro!
      Receba um sincero abraço.

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  8. Boa noite.
    Dizer o quê, desse malandro que só canta quando quer, aparece quando já não há frio e para mais é um pai desnaturado. Gosta da brincadeira, mas depois são os outros que aturam os seus filhotes, é assim ou não?
    Já vi muitos cucos e poupas " essas mal cheirosas", que como dizes, devem ser como nós agora, poupar, poupar e não chega.
    Mas que são aves lindas isso são, e ouvilas cantar lá no silêncio da serra, que maravilha.
    Abraço

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    1. Tens razão Serip, estas aves são lindíssimas e cheirem bem ou mal e cada vez mais raras, fazem parte das nossa memórias, apesar de cada vez mais arredadas até pelos incêndios e falta de cultivos, mas ainda por lá andam e quem as quiser ouvir, basta levantar ao nascer do sol.
      Um abraço e se não nos virmos, uma Páscoa feliz!

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  9. Sim, pai desnaturado, boémio brincalhão e muito teimoso como "reza" esta recordação na memória dos mais antigos:

    "Era uma vez um cuco que não gostava de couves
    Ele estava sempre a dizer "couves não hei-de comer"
    Mandou-se chamar o pau para bater no cuco
    O pau não quer bater no cuco
    O cuco não quer comer couves
    E o cuco sempre a dizer couves não hei-de comer.
    Mandou-se chamar o fogo para vir queimar o pau
    O lume não quer queimar o pau
    O pau não quer bater no cuco
    O cuco não quer comer as couves
    E o cuco sempre a dizer couves não hei-de comer.
    Mandou-se chamar a água para vir apagar o fogo
    A água não quer apagar o lume
    O lume não quer queimar o pau
    O pau não quer bater no cuco
    O cuco não come as couves
    E o cuco sempre a dizer couves não hei-de comer.
    Mandou-se chamar a vaca para vir beber a água
    A vaca não quer beber a água
    A água não quer apagar o lume
    O lume não quer queimar o pau
    O pau não quer bater no cuco
    O cuco não come as couves
    E o cuco sempre a dizer couves não hei-de comer.
    Mandou-se chamar o homem para vir buscar a vaca
    O homem não quer vir buscar a vaca
    A vaca não quer beber a água
    A água não quer apagar o lume
    O lume não quer queimar o pau
    O pau não quer bater no cuco
    O cuco não come as couves
    E o cuco sempre a dizer couves não hei-de come".

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  10. É muito engraçada essa ligação entre a cultura dos povos e a natureza!
    A t-shirt veio da requintada boutique Feira de Cerveira!
    Beijinho

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  11. Então, Feliz Páscoa, Xico!
    Beijinhos

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    1. Feliz Páscoa , Nina!
      Apesar dos abusos tal como o cuco nos regalos da doçaria, a poupa vai avisando: "poupem, poupem...".
      Venham agora as amêndoas e bolos de azeite e a seguir, nova quaresma de abstinência!
      Beijos.

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  12. Nos doze dias que passei na nossa terra de nascença verifiquei duas coisas:
    Há ainda muita passarada a moldar a aldeia: andorinhas, pintassilgos, cucos, poupas (que começam a cantar ainda de madrugada) o que para mim quer dizer que, pelo menos para as aves as nossas terras continuam a ser o que eram antes, por isso não mudam de sitio. Já o mesmo não se pode dizer das pessoas, que cada vez mais vão para outras paragens e aos poucos e poucos se afastam de vez de Forninhos.
    Gostei muito de ouvir o cucu-cucu- do cuco e o pupupa da poupa.

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