Sobre a matança do porco, Miguel Torga, escreveu: «Por alturas do Natal, começa a matança. Ao romper da manhã, a paz de cada povoado é subitamente alarmada. Um grito esfaqueado irrompe o silêncio. Dias depois desmancha-se a bizarma e um pálio de fumeiro cobre a lareira.».
O
«O porco, criado e cevado com desvelos de que gozam poucos humanos, lá está a sangrar no banco do sacrifício. Berra que espanta a penumbra da madrugada, mas o seu sofrimento não encontra eco nos ouvidos de ninguém. Quanto mais barulhenta for a agonia, mais escoado ficará o seu corpo no chambaril.».
Apesar do sofrimento do animal, a matação noutros tempos era um dos acontecimentos com mais entreajuda e espírito de grupo na vida das gentes forninhenses. No dia da matação convidava-se a família e amigos para todo o dia, trabalhava-se, comia-se, bebia-se, pelo meio havia uns joguitos de sueca e xincalhão, podemos até afirmar que o dia da Matação era um dia de festa.
Recordamos aqui uma matação feita no pátio da família Guerrilha, não sei o ano, mas dá para ver que já passaram uns anitos sobre este dia. Os homens deitaram mãos à obra como convém, não deixando escapar os dois porcos e cumprindo as etapas próprias deste ritual...esta tarefa, como sabem, tem rotinas muito precisas e é feita com muito empenho e só por quem sabe. Aproveito este post para uma homenagem aos bons “matadores” de Forninhos.
Depois segue-se a desmancha, de onde virão os torresmos (como já aqui publicamos), as chouriças dos bofes e da carne e mais tarde as pás e os presuntos, tudo uma delícia, com um sabor de tradição.
Nota: Coloquei O (bolinha) para as pessoas mais sensíveis.
Tradições....somos fruto de muitas tradições,mas me corta o coração ver os bichinhos morrendo,talvez por isso esteja deixando de comer carne.
ResponderEliminarMas sãao estas tradições que jamais devem ser esquecidas,pois atravez destes encontros e que se fortificam os laços.
Beijinhos
Deusa
vasinhos coloridos
Depois dos homens matarem o porco a seguir começavam a chamuscá-lo.Agora este trabalho já é feito com o maçarico mas antigamente era feito com palha.A tradição da matação já não é o que era e é uma tradição que se está a perder cada vez mais pois já são cada vez menos as pessoas que cevam e matam o porco.
ResponderEliminarNa senda das outras entradas, mais uma e lembrar tradicoes das nossas aldeias da beira, continue que assim e que deve ser!
ResponderEliminarGostei isso da bolinha vermelha!!!, Nao ha como comecar o ano a rir!
Um abraco de amizade dalgodrense.
Oi Paula
ResponderEliminarPor aqui tambem é assim, embora com muito menos frequencia...mas é um dia de festa mesmo, a família se reune, tem serviço para todos...e é uma delícia
beijinho
Tina (MEU CANTINHO NA ROÇA)
Muito bem observado al cardoso hehehehe, mas a bolinha foi colocada como um aviso, pois a imagem da matança tem a sua “crueza”, mas se compararmos com as imagens que vemos todos os dias nas TVs........mas acabadas as colheitas e com a terra a descansar sob a geada, para o novo ciclo de produção, é chegada a hora de morrer.O porco de ceva jejua a noite anterior para “limpar”. Chegam cedo os convidados para o mata-bicho, onde era costume, lembro-me, haver uns requeijões e filhós, chouriça e presunto do ano anterior, não podia faltar também o bagaço. Depois seguia-se para o cortelho para aprisionar o porco com um rabeiro. O matador com a faca na mão. Nesta imagem vemos já o porco amarrado, já seguro pelas patas, pelos homens. Se aumentarem a imagem vê-se também o matador e a mulher com o alguidar, que se vai encher de sangue, onde já está algum pão de trigo partido em pedacinhos para depois se fazer as saborosas morcelas.
ResponderEliminarDe seguida, como diz Lopes, procede-se à limpeza do porco, tosta-se a pele, hoje o maçarico a gás substitui a palha. Tira-se as unhas, raspa-se todo o pêlo, escalda-se a língua e as orelhas e depois de bem limpo o porco pendura-se numa trave para ser “operado” pelo matador. As tripas são apartadas para um tabuleiro de madeira e depois serão lavadas no ribeiro pelas mulheres. Também se tira alguma carne para ir à mesa neste dia. Os rins, fígado. Com os rins faz-se um petisco “trás-de-orelha”. São muitos os momentos que aqui podemos retratar e descrever, por isso, continuem com a descrição das tarefas da matação, recordem estes momentos e hábitos comunitários com origem em tempos imemoráveis. Que a nossa memória não as deixe esquecer.
A discrição que a Paula faz está muito bem, este dia de matança ou matação, era um dos dias mais marcantes nas famílias da Beira.
ResponderEliminarOs trabalhos começavam cedo, as mulheres punham os panelões de ferro ao lume para terem sempre agua quente, punham a carne velha a cozer, preparavam alguidar e o pão cortado para aparar a sangria, o tabuleiro para aparar as tripas, panos brancos para… (bem, aqui não digo porque teria de colocar a bolinha vermelha), cortar muita cebola, prepara os utensílios para a lavagem das tripas no rio etc.
Os homens começavam por matar o bicho com uns figos secos e aguardente porque nestes dias faz frio, e também o já descrito no comentário anterior.
Preparava-se o carro de bois onde se amarrava o focinho do cevado ao touço para que não estrebuchasse e complicasse o trabalho do matador.
A sangria ia directamente para o alguidar onde era misturado com o pão, talvez aqui o segredo das boas morcelas da nossa terra.
De seguida era a chamusca, já descrita tb no comentário anterior, e a lavagem com a agua quente dos panelões e ia a pendurar onde o matador embuchava o bicho.
Quando sai a fressura, é quando logo aparece um “cozinheiro” que trata do petisco bem picante para se beber mais um copo.
Depois de almoço, era a sueca e o xincalhão, as mulheres tinha trabalho para o dia todo por causa das morcelas.
Todas estas tarefas eram concluídas como que, um cerimonial que não podia ser alterado.
Hoje esta tradição está quase extinta e sem probabilidade ser reeditada, todos nós sabemos os porquês, e um deles, mostra-nos a Paula com a bolinha vermelha, mas que se perde a boa morcela e as chouriças caseiras, isso perde
Eu que nunca gostei muito do dia da matação, confesso que me emocionei deveras ao recordar estes momentos que aqui ed santos conseguiu tão bem retratar e descrever. O momento de matar o porco era um momento de agonia que eu nunca consegui presenciar e afastava-me sempre. Mas como digo no intróito deste post o dia da matação era um dia de festa na casa da família que matava.
ResponderEliminarOs homens, depois do porco pendurado, a partir daí era comer e beber bem, começava a copofonia e a jogatina. As mulheres para além de lavarem as tripas, prepararem a sopa da matação e as carnes para o almoço e tudo o resto...ainda tinham de ouvir os homens hehehe.
Tambem ha um pitéu no dia da matação que é o redanho,bem frito, com pão centeio e um copo de tinto, é uma delicia.
ResponderEliminarObrigado por estas recordações e um bom ano para todos.
É verdade o dia da matação era um dia de festa passado em familia e com os amigos.Antes cada casa de familia tinha pelo menos um porco para matar mas cada vez são menos pessoas e os mais velhos já não se sentem com forças.Os médicos tambem proibem a carne de porco e enchidos e tudo isto leva a que esta tradição acabe. As tripas lavam-se num rio ou ribeiro ou outro sítio com água corrente e abundante e são muito bem lavadas e esfregadas com sabão e limão.Algumas vão ser logo cheias no dia da matação com o sangue do porco,trigo e outros condimentos e dão saborosas morcelas. Outras vão ser enchidas passados uns dias com carne que vão dar as saborosas chouriças.
ResponderEliminarolá,pois a matança do porco a bem dizer é igual em muitas terras deste Portugal, na minha terra é da mesma maneira que se mata o animal, mas é uma tradição que est+a com tendencia a desaparecer, agora já não se usa a faca para matar o porco, mas sim uns electrodos, que são aplicados nas orelhas do animal e se dá uma descarga electrica de modo a que o animal sofra uma decarga de modo a que este fique inconsciente e só então é pendurado, para ser sangrado e esventrado, quanto ao resto é tudo como já foi descrito.
ResponderEliminarDe uma maneira ou de outra o porco acabará sempre por morrer, para que haja enchidos e presuntos. Mas é uma pena que esta tradição, este acontecimento doméstico, que sempre fez parte da vida das nossas gentes, que envolvia tanta entreajuda e espírito de grupo, esteja condenada ao desaparecimento. Os tempos são outros. A acrescer ao referido por Lopes há as exigências sanitárias hoje cada vez mais incisivas, mas há actos e rotinas de uma vida inteira que as populações não podem, de um momento para o outro, deixar de fazer o que sempre fizeram bem, só porque lho impõem. Não me refiro apenas ao acto de matar e conservar o porco, bácaro ou cevado, como também lhe chamavam, mas outras, como o fabrico do queijo, enchidos; destilação do bagaço, etc. A Beira precisa elevar a sua auto-estima e defender melhor as suas práticas ancestrais, com as devidas adaptações, claro!
ResponderEliminarDesconhecia este modo que J.Seguro nos descreve, em que o bácoro é submetido a choque eléctrico.
ResponderEliminarEste método era utilizado apenas em abates industriais, pode já ser os efeitos das mudanças.
Esta tradição tem tendência a acabar, não só por imposição das autoridades sanitárias, mas também pelo próprio modo de vida que se está a verificar nas aldeias. Quando a geração actual, que ainda vai mantendo aqui e alem estes modos de vida, acabar, com toda a certeza que estas tradições também acabam, não só porque o modo de vida mudou, como também, porque não o sabem fazer.
O fabrico de aguardente bagaceira de modo artesanal, tem tendência a seguir o mesmo caminho.
Já o queijo da serra, arranjaram-lhe uma saída, embora, não muito tradicional, mas sempre se fez alguma coisa para que os pastores que queiram manter os seus rebanhos o possam fazer.
A matança do porco tinha um grande significado no mundo rural, porque era daí que saía o"governo" da casa para o ano inteiro. A população alimentava-se somente com o que a terra produzia e do porco, que tinha de dar para o ano inteiro. Actualmente não é assim e ainda bem. Mas de uma forma ou de outra há coisas que ainda mais ou menos se vão mantendo: o feijão na arca, o vinho na pipa, o azeite e chouriça no pote, o porco na salgadeira, a lenha no coberto. Isto ainda hoje se vê na casa rural.
ResponderEliminarMesmo em relação aos enchidos e carnes da salgadeira ainda há o costume de alguns se comerem em festividades marcadas, como no Entrudo (rabo do porco no Domingo magro; cabeça de porco no Domingo gordo). Estou a lembrar-me também que no dia da matação fazia-se o palaio que se comia no dia da desmancha. O palaio é um enchido obtido a partir da massa das morcelas, portanto, feito no dia da matação, mas o enchimento é mais largo, se não me engano era feito com tripa do intestino grosso. O palaio é um enchido que nem sempre calha bem, isto é, ou rebenta ou fica mal cozido. Nem sei se ainda se faz…
Ola pesooal!
ResponderEliminarVotos de um ano feliz para todos, em especial para Deusa e Tina, que trazem um "quentinho" a este Portugal, agora invernoso.
As palavras aquecem o coraçao. um beijo para elas.
Fui a Forninhos e este ano o vinho parece mais forte, ou entao a idade da menos luta.
Mas adorei, de tal maneira que fiquei dois dias em casa a recuperar.
Da mataçao esta praticamente tudo dito, nas palavras dos comentadores.
De facto o mata-bicho, tinha tudo o que foi dito, mas em minha casa (da minha senhora mae, como diz o presidente de Sintra, Fernando Seara), havia castanha assada, petinga frita e lombo frito, alem do requeijao.
Em miudo, e fazendo comparaçao com as touradas, comecei por segurar o rabeiro na boca do bacoro, depois a rabejador, mais tarde a levar as patadas da mao traseira do bicho; cruzar a perna esquerda por cima da direita, era obra!
Mas era uma festa!
Uma grande festa!
A ajuda da garotada fazia parte da realidade da nossa terra, ajudavam e atrapalhavam naquilo que podiam. Até se brincava com as unhas do porco!
ResponderEliminarA rematar este artigo sobre o dia da matação, elenco algumas expressões populares, ligadas à criação do porco, à matança e à preparação de algumas peças gastronómicas, muitas delas já em desuso, porque a realidade que elas representam deixou de existir:
BÁCORO: porco.Também se usava bácro e reco.
BARRASCO: porco de cobrição.
CORTELHO: local onde se recolhe o porco.
VIANDA: refeição do porco, que consiste em água de lavagens com verduras e farelo.
ARGANEL: arame que se colocava no focinho dos porcos para que não revolvam.
PIA: recipiente de pedra para deitar comida aos porcos.
CEVA: acto de alimentar o porco, preparando-o para a matança.
BANCO DE MATAR: base de madeira, com quatro pés, onde o porco é deitado para ser morto.
MATADOR: homem que mata e abre os porcos.
CHAMUSCAR: acto de queimar os pêlos do porco na matança.
ALUMIEIRA: mão-cheia de palha que se acende para chamuscar o porco.
ESBANDULHAR: acto de abrir o porco e extrair-lhe as tripas (bandulho) logo após a matança.
CHAMBARIL: pau curvo com recravas nas extremidades, que se enfiam nos tendões da pata do porco da matança, janetes ou jarretes, para o dependurar num local apropriado, de cabeça para baixo. Também se diz chambril.
REDANHO: rede de gordura que envolve os intestinos do porco, de onde se fazem uns torresmos muito apreciados.
MARRÃ: Toucinho fresco de porco frito.
PROVA: amostra da massa das morcelas, o primeiro enchido da matação, que é confeccionada numa sertã para verificar os temperos.
PALAIO: peça de enchido.
DESMANCHA: acto de desmanchar o porco, um ou dois dias após a matança, quando a carne já assentou.
pois é, o dia da matança é mesmo um dia de festança, comer e beber, e conviver com familiares e amigos. o animal é convidado a participar como convidado principal.
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